Os primeiros pormenores da vida
de Florence são fornecidos por ela própria, em carta dirigida a Mr. Harrison em
maio de 1872. Diz a carta:
Tenho 16 anos de
idade. Desde a minha infância vejo os espíritos e ouço-os falar. Tinha o
costume de sentar-me a sós e conversar com eles. Eles me cercavam e eu os
tomava por pessoas vivas. Como ninguém os via nem ouvia, meus pais procuraram
inculcar em mim a ideia de que tudo era produto de minha imaginação. Todavia
não conseguiram modificar o meu modo de pensar a respeito do assunto e foi
assim que passei a ser considerada como uma menina excêntrica. Na primavera de
1870 fui convidada a visitar uma amiga de colégio. Ela me perguntou se eu já
ouvira falar de Espiritismo, acrescentado que seus pais e ela se reuniam em torno
de uma mesa. Nessa situação obtinham certos movimentos; disse que, se eu
consentisse, ainda naquela tarde ensaiariam uma experiência comigo.
Miss Cook pediu permissão a sua
mãe e, em seguida, realizaram a primeira sessão, obtendo-se a comunicação de um
espírito que se dizia ter sido a sua tia. Mais tarde, quando a jovem ficou em
pé junto a mesa, esta se ergueu a uma altura de 4 pés. Miss Cook dá
continuidade ao seu relato:
Na segunda sessão os
espíritos nos deram provas de identidade, mas não chegamos a ficar de todo
convencidas. Por fim, recebemos por tiptologia, uma comunicação orientando-nos
para que deixássemos o aposento em penumbra. Eles me ergueriam e dariam comigo
volta à sala. Não consegui conter o riso. Aquilo não era possível. Entretanto, decidiu-se
apagar a luz. Apesar disso, a claridade que entrava pela janela não deixou a
sala inteiramente às escuras. De imediato senti que alguém me tirava da
cadeira, e, no instante seguinte, fui erguida até o teto, fato que todas as
pessoas presentes na sala puderam ver. Sob meu espanto, transportaram-me sobre
as cabeças dos assistentes, até que fui posta sobre uma mesa existente no
extremo da sala. Minha mãe indagou se podíamos obter esse fenômeno. A mesa
respondeu que sim, visto que eu era médium.
Reunimo-nos em nossa
casa. Os espíritos quebraram a nossa mesa e duas cadeiras, fazendo ainda outros
estragos. Em vista disso, resolvemos que, de modo algum tornaríamos a realizar
sessões. Então os espíritos começaram a nos atormentar, atirando sobre mim
livros e outros objetos; as cadeiras passeavam sozinhas pela sala, a mesa se
erguia violentamente, enquanto fazíamos as refeições, e fortes ruídos eram
ouvidos durante a noite, fazendo-nos estremecer de medo. Por fim nos vimos
obrigadas a nos reunirmos em torno da mesa e a tentar um diálogo com eles.
Os espíritos
disseram que fôssemos a Navarino Street, 74 onde existia uma sociedade
espírita. O endereço estava certo. Lá encontramos Mr. Thomas Blyton que nos
convidou a assistir a uma sessão onde entrei em transe e, por incorporação, uma
entidade disse aos meus pais que, se contássemos com o auxílio de Mr. Herne e
Mr. Williams, obteríamos comunicações de valor. Reunimo-nos várias vezes e,
finalmente, obtivemos os fenômenos prometidos. O espírito que dirigiu a sessão
disse chamar-se Katie King.
No dia 21 de abril de 1872, em
sessão organizada para estudos de sua mediunidade, conforme ata publicada no
"The Spiritualist", ouviu-se um bater de vidros da janela sem que
ninguém descobrisse a causa. Então ouviu-se a voz de um espírito que disse:
"Mr. Cook, é preciso que façais desobstruir o canal da calha, se desejais
evitar que os alicerces da casa sofram". Surpresos, os presentes
procederam a exame imediato, havendo a confirmação do que fora dito. No dia
seguinte, em outra sessão, o espírito Katie King se materializou parcialmente
pela primeira vez. Katie mostrou-se na abertura da cortina e falou durante
alguns minutos, ocasião em que os presentes puderam acompanhar o movimento de
seus lábios.
Florence Cook foi a primeira médium
entre os médiuns ingleses a obter materializações integrais em plena luz. Com o
avanço das experiências, Florence, que antes, nas materializações parciais
permanecia consciente, passou a cair em transe à medida que Katie King ia
adquirindo domínio da situação e conseguindo-se mostrar mais perfeitamente. Seu
rosto a princípio dava a impressão de ser oco por trás. Mais tarde
preencheu-se, os crepes ectoplásmicos se tornaram menos abundantes e, um ano
depois, ela já conseguia caminhar do lado de fora da cabine.
Quando lhe pediram para se
deixar fotografar à luz de flashes, observou-se que a sua semelhança com
Florence era muito grande. Era um problema, e, para provar que era um ser
distinto de Miss. Cook, ela alterou a cor de sua face para tons de chocolate e
azeviche. Em uma experiência feita logo em seguida, a médium foi amarrada
apertadamente pelos assistentes no interior do gabinete. Depois foi observada
toda uma gradação de diferenças entre ela e a médium. Estava reservado a Sir
William Crookes fornecer as provas definitivas de que Katie King tinha uma
existência à parte da de Miss Cook.
É preciso consignar que foi a
própria Florence quem procurou o professor Crookes a fim de solicitar-lhe que
investigasse a sua mediunidade. Eis como ela narra o episódio:
Fui à casa de Mr.
Crookes sem dizer nada aos meus pais nem aos meus amigos. Ofereci-me como um
sacrifício voluntário perante a sua incredulidade. Pouco antes se dera o
desagradável incidente com Mr. Volckman. Os que não conheciam o fenômeno
dirigiam palavras cruéis contra mim. Mr. Crookes fizera um comentário que me
atormentava e foi por isso que me decidi a ir procurá-lo. Ele me recebeu e eu
lhe disse: ‒ Já que acreditais que sou uma impostora, se quiserdes virei
submeter-me a experiências em vossa própria casa. Vossa esposa pode vestir-me
como quiserdes e deixarei convosco o que tiver trazido. Podereis vigiar-me como
vos aprouver; submeter-me-ei às experiências que desejardes, de modo que vos
contenteis em todos os sentidos. Só imponho uma condição: se verificardes que
sou agente de uma mistificação, denunciai-me publicamente; mas se vos
certificardes de que os fenômenos são reais e de que eu mais não sou que o
instrumento de forças invisíveis, isso direis ao público de modo que todo o
mundo tome conhecimento da verdade.
William Crookes aceitou o repto,
disso resultando um dos mais tumultuosos e dramáticos episódios da História do
Espiritismo.
Após a despedida do espírito
Katie King, a mediunidade de Miss Florence foi utilizada por outra entidade que
dizia chamar-se Marie, a qual, por mostrar-se cantando e dançando, foi
denominada Marie, a dançarina. Em 1899, atendendo a um convite da Sphiny
Society, de Berlim, Miss Cook já então Mrs. Corner pelo casamento, assentiu em
realizar algumas sessões, nas quais Marie se materializou e produziu fenômenos
sensacionais. Por essa altura Florence já se havia casado, em 1874, com um
cavalheiro chamado Elgie Corner e vivia em Usk, no País de Gales, onde teve
vários filhos.
Em 1904, William Crookes recebeu
uma carta, datada de 24 de abril, na qual era-lhe comunicado o falecimento de
Mrs. Corner. Ele respondeu expressando viva simpatia e declarando ainda que a
vida post-mortem muito devia, quanto
à sua certeza, à mediunidade da antiga Miss Florence Cook. Com esse episódio se
encerra uma vida que conheceu tanto sensacionalismo quanto o das grandes
atrizes da atualidade. A Doutrina Espírita deve eterna gratidão à menina de 15
anos, que, sacrificando sua juventude nos laboratórios dos sábios, prestou os
mais relevantes serviços à comprovação científica da imortal obra de Allan
Kardec.
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