Jorge Hessen
Após a desencarnação de Allan
Kardec o Movimento Espírita francês e mundial sucumbiu, devido à imaturidade
doutrinária de Pierre G. Leymarie. A ele foi incumbida a administração do
espólio da família de Kardec, assumindo a obrigação de sustentar a propagação
do Espiritismo, mas em vez disso mistificou a propaganda doutrinária, e para
descrédito do Espiritismo teve que amargar uma cadeira por comprovadas fraudes
veiculadas na Revista Espirita. Leymarie era um apaixonado praticante da
Teosofia de Blavatsky e defendia as ridículas obras de J.B. Roustaing e para
variar era deslumbrado pela maçonaria. Ora, com tal “curriculum vitae”, as suas
atuações suscitaram o desfalecimento do Movimento Espírita mundial.
Cinco décadas após a
desencarnação de Kardec, nos primórdios do século XX, houve um surto de
renascimento do Movimento Espírita francês e mundial até meados da década de
1920, graças às lideranças de Leon Denis, Gabriel Delanne, Gustave Geley e
Camille Flammarion, desaparecendo porém rapidamente, quando esses quatro
baluartes desencarnam. Logo após, durante a Segunda Guerra Mundial, ocorreu
desmontagem e quase o total aniquilamento do Movimento Espírita nas plagas de
Kardec. Sobre esse cenário, André Luiz indagou ao Espírito Gabriel Delanne: “Qual a opinião acerca do Espiritismo, na
França”? Delanne respondeu: “Não nos
é lícito dizer haja alcançado o nível ideal (…) mas, complementando que legiões
de companheiros da obra de Allan Kardec reencarnaram, não só na França, porém
igualmente em outros países, notadamente no Brasil, para a sustentação do
edifício kardequiano”[2].
Sobre o translado do
“Espiritismo” para o Brasil, estamos convencidos de que a transposição da respectiva
“direção” do Movimento Espírita mundial, da França para o Brasil, sobreveio após
a desencarnação dos quatros baluartes supramencionados, no período entre o
final da década de 1920 e o início da década de 1930, aliás, coincidindo com o
início da missão mediúnica de Francisco Cândido Xavier. Antes desse período, o
Espiritismo que era praticado no Brasil seguia o modelito Laymareano, portanto,
obrigatoriamente inspirado pela teosofia e pelo roustanguismo, introduzido e
apoiado por Luiz Olímpio Teles de Menezes, em seguida liderado pela entidade
(edificada a partir do Grupo “Confúcio”) que decidiu autoproclamar-se “mãe” das
instituições espíritas do Brasil.
Retornemos à França. O Movimento
Espírita francês voltou a se recuperar com certa debilidade por volta dos anos
de 1950 e 1960 em razão do regresso ao país de alguns espíritas que residiam no
Norte da África (Argélia, Marrocos) e começaram a retornar para a terra de
Kardec, arriscando remontar o Movimento Espírita. Nesse sentido, sob a batuta
de Roger Perez houve uma breve “oxigenação” do Movimento Espírita francês,
porém, a bem da verdade, nunca se recuperou, pelo menos em Paris.
Hoje há diferentes núcleos
espíritas no interior da França, mas sem as características daquelas propostas
por Allan Kardec. Sobre isso, recebi de notícias de Charles Kempf, um líder
espírita francês, residindo na França e participando do Movimento Francês desde
os anos 1990, afiançando-me que as dificuldades continuam as mesmas até hoje,
por causa do personalismo exagerado de alguns dirigentes, e desinteresse
pessoal na atuação no movimento. Tudo isso por falta de estudo das obras básicas da codificação.
Do exposto, pois, indagamos:
quais os desafios para o progresso do Espiritismo? Segundo Gabriel Delanne
(Espírito) a divulgação e o progresso do Espiritismo na Terra terão de
efetuar-se de pessoa a pessoa, de consciência a consciência. A verdade a ninguém
atinge através da coação. A verdade para a alma é semelhante à alfabetização
para o cérebro. Um sábio, por mais sábio, não consegue aprender a ler por nós.
Talvez esse “progresso” do processo de propaganda espírita seja moroso demais
para a humanidade, mas, ainda segundo Delanne (Espírito), uma obra-prima de
arte exige, por vezes, existências e existências para o artista que persegue a
condição do gênio. Como acreditar que o esclarecimento ou o aprimoramento do
espírito imortal se faça tão só por afirmações labiais de alguns dias?[3]
César Perri, ex-presidente da
FEB no Brasil, lembra-nos que muitos espíritas e diversos dirigentes jamais
leram obras psicográficas de Chico Xavier (não consultam as fontes primárias –
os livros), pois estão presos anos seguidos a estudo de “apostilas”. A
liderança “oficial” do movimento espírita brasileiro não acompanha a expansão
da base, ou seja, dos centros espíritas. Há muito a ser realizado para a
compreensão da união entre os espíritas – como laço moral, solidário e espiritual.
Deve-se observar o respeito à diversidade das situações e condições dos centros
espíritas e o conhecimento dessas realidades para o melhor atendimento e apoio
às reais demandas das diversificadas instituições. O trabalho de união deve ser
constantemente adequado às bases do movimento, ou seja, os centros espíritas[4]. Em
suma, cremos que o progresso da Doutrina dos Espíritos não advirá por meio de
lideranças federativas, com insuficientes lastros morais, hierarquizadas,
emblemáticas e mercantilistas. Aliás, para quem conhece as opiniões de Leopoldo
Cirne, após sua saída voluntária da FEB, identificará muitos pontos
convergentes que esteamos cá no artigo.
Nossa proposta, e eis aí o
grande desafio, é a propagação do Espiritismo no interior do centro espírita
através do intercâmbio fraterno do “boca a boca”, “pessoa a pessoa”,
“consciência a consciência”, “ombro a ombro”, sem nenhuma necessidade das
algemas burocráticas impostas pelas “autoridades” e lideranças federativas
“oficiais”, quase sempre sem os lastros de amor e humildade. Lideranças
“oficiais” que nada mais fazem do que digladiarem entre si na busca de poderes,
de mandos, desmandos e apropriação indébita da coordenadoria do Movimento
doutrinário, que deve ser livre, categoricamente distante dos ranços
ultramontanistas da pretensa “casa mãe” dos espíritas.
Inspirando-nos em Herculano
Pires, reafirmamos que o Espiritismo no Brasil não terá salvação se permanecer
sob o tacão das diretrizes oriundas do sofisticado colégio cardinalício (CFN) e
das hierarquias impostas pelos ditos órgãos oficiais. Razão pela qual
reafirmamos que o Espiritismo necessita retornar às suas origens primordiais
(pré-desencarnação de Kardec) que é a SIMPLICIDADE! Ou seja, sem absoluta
necessidade de concessionárias “oficiais”[5].
[2] XAVIER, Francisco Cândido e VIEIRA Waldo. Entre irmãos
de outras terras, Entrevista realizada pelo espírito de André Luiz com o
espírito de Gabriel Delanne, RJ: Ed. FEB, 1970
[3] Idem.
[5] Que não tem nada a ver com a presumida Comissão
Organizadora do Espiritismo, segundo Allan Kardec.
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