quarta-feira, 5 de julho de 2017

MENTES INTERLIGADAS – Os novos conhecimentos podem nos ajudar?[1]


Sandro Fontana


Existe uma boa quantidade de espíritas que acredita  que o espiritismo está completo, possuindo informações e conhecimentos suficientes para todos nós, basta apenas colocar isso em prática ou ler sobre eles. Bom, isso não deixa de ser verdade, ao menos para a grande maioria da população, mas apenas no que se refere à parte moral/ religiosa, uma vez que o segmento científico do espiritismo ainda requer muitas respostas para coisas mais simples.
Dentre as várias lacunas que o espiritismo possui (ou ainda carece de respostas exatas), está a comunicação mediúnica entre vivos em estado de vigília (acordado). Se, de um lado há aqueles que acreditam ter a resposta já consagrada para este fato, por outro há aqueles que ainda questionam a certeza sobre isso.
Recentemente foi publicado no Jornal de Estudos Espiritas (JEE) um trabalho bibliográfico onde o autor, Paulo Neto[2], explora em detalhes a Codificação e trabalhos de outros autores (i.e Ernesto Bozzano), defendendo a ideia de que não é possível ocorrer uma comunicação entre vivos estando eles em estado “acordado”.
Se houvesse apenas este estudo publicado sobre o tema, então seria algo bem aceito, principalmente frente às citações e argumentos explorados pelo autor. Ocorre que um grupo de pesquisadores espíritas do IPCE (Instituto de Pesquisas em Ciência Espirita) resolveu testar isso na prática e os resultados iniciais apontam para algo contrário ao concluído por Paulo Neto (2015).
O estudo do IPCE ainda está numa fase inicial onde se está aprimorando o método e testando experimentos objetivos. Uma pesquisa desse porte requer médiuns com elevado nível mediúnico e isso não é tão comum assim no meio espirita geral, portanto os resultados finais desse projeto ainda devem demorar um pouco para serem publicados.
Numa análise minha sobre o tema, avaliando o posicionamento de Kardec e outros materiais complementares, entendo que o resultado seria inconclusivo até o presente momento, isto é, com o que temos de dados e fatos é prematuro optar por uma ou outra opção como verdadeira.
No entanto fui buscar, no meio cientifico-aberto, artigos e pesquisas que pudessem colaborar para um melhor entendimento sobre essa questão.
Os melhores estudos estão no campo da parapsicologia, embora ainda haja centenas de estudos da telepatia que impactam diretamente sobre essa “lacuna”, afinal, telepatia não deixa de ser uma comunicação entre espíritos encarnados, não?
Os experimentos telepáticos, sem sombra de dúvida, sinalizariam um resultado diferente ao proposto por Paulo Neto e isso implica em boa parte da Codificação também, haja visto que há momentos em que Kardec opta que a comunicação possa ocorrer, mas não em estado de vigília.
Ao longo de muitos anos pesquisadores de diversas áreas estudaram e vem estudando a comunicação mente-a-mente entre humanos, e isso vai desde enviar um símbolo de A para B, como também, por enviar sinalizações ou informações mais completas e abstratas. Tudo isso ocorre de forma consciente, ou seja, tanto o indivíduo emissor (A), quando o receptor (B) estão acordados.
A questão, no entanto, é bem mais complexa do que se parece. Temos alguns experimentos do passado, relatado por Paulo Neto, que apontam a dormência do indivíduo evocado, no entanto o modus operandi utilizado para tais casos é diferente do utilizado nos experimentos telepáticos.
Na telepatia (estudos Ganzfeld), inicialmente, se utilizava questões objetivas, podendo quantificar os resultados, já os estudos mediúnicos eram mais abrangentes e difíceis de mensurar, e olha que posso afirmar que muitos deles ficaram a desejar sobre a certeza da real comunicação, me refiro a determinados controles, tais como vazamento de informação, objetividade nas respostas etc..
Mas o que há de diferença entre ambos os casos? A principal diferença é a forma como se atua na experimentação. Nos casos mediúnicos se utilizava um médium em uma sessão e se fazia a evocação do espírito do encarnado. William Stead (médium inglês) relatou em um de seus livros (Cartas de Julia), que executou diversos experimentos, sem aviso aos encarnados, de que evocaria seus espíritos para conversar. Os resultados foram muito impressionantes, inclusive num deles, surgindo uma assinatura igual ao do encarnado.
Nesses mesmos experimentos de Stead, vale salientar, que não fica explícita ou clara a dormência do evocado.
Outra diferença, que chama a atenção, é o fato da inconsciência mesmo durante o momento da evocação, isto é, os encarnados não sabiam que haviam sido evocados e nem que responderam as questões. Há casos, em outras experiências, onde houve relato de sonolência e outros que não, mantendo ainda uma dúvida sobre essa temática de comunicação em estado de vigília.
Ademais tudo isso, quando Kardec indaga os espíritos a responderem sobre esse tema, a resposta induz a várias interpretações, sugerindo a sonolência inclusive, ficando evidente que a pessoa evocada não conseguiria exercer atividade inteligente ao mesmo tempo em que responderia ou se utilizaria de um médium para se comunicar.
Nos dias atuais vários pesquisadores tem aprimorado estudos referentes a telepatia e há alguns deles de suma importância para essa dúvida espírita. Dean Radin, um pesquisador dedicado a essa temática, escreve em um de seus livros um importante experimento que fez onde se utilizou de um EEG (Eletroencefalograma) para observar os sinais mentais entre transmissor e receptor.
A título de conhecimento geral, é importante enfatizar que a média de acertos para os experimentos telepáticos está em torno de 33%, onde o acaso é de 25%. Isso implica, devido a quantidade de amostragens, que a fenomenologia ocorre de fato, no entanto ainda é muito fraca e instável, motivo pelo qual os céticos ainda criticam pesadamente essas evidências, não aceitando assim a existência do fenômeno.
Voltando ao experimento de Radin, os resultados foram um tanto impressionantes, motivo pelo qual vários pesquisadores repetiram o método, obtendo resultados muito similares. Mas o que ocorreu de fato?
Nas sessões ocorreu que, quando um transmissor (A) enviava uma mensagem ou sinal para um receptor (B) (mesmo não sendo médium), os sinais de EEG eram comparados e se observou a mesma sinalização no receptor, mesmo que esse não conscientizasse a informação. Isso pode parecer algo sem importância aos mais desatentos mas para quem entende e busca conhecer o fenômeno, isso faz toda a diferença. Vamos entender um pouco melhor isso.
Imagine uma pessoa sentada numa sala, na frente de um monitor. Imagine também que sua cabeça está cheia de eletrodos e alguns médicos estão monitorando suas atividades cerebrais.
Quando uma imagem é exibida no monitor, seu cérebro reage a elas e gera uma alteração nas ondas cerebrais.
Agora imagine que esse indivíduo se concentra para enviar o que está presenciando para outra pessoa, em outra sala, que também esteja com eletrodos monitorando seu cérebro.
O que ocorreu nesses casos é que o cérebro do receptor demonstrou variações similares de picos de onda no exato momento em que a mensagem/imagem lhe foi enviada, demonstrando que o fenômeno ocorre de fato, no entanto nem sempre o receptor conseguia entender/perceber (conscientizar) o que lhe era enviado.
Isso, no meu entender, traz para o conhecimento espírita algo muito importante e convergente com relatos de estudos do passado sobre a comunicação mediúnica entre vivos, uma vez que aponta a diferença entre o consciente e inconsciente e a relevância disso para uma efetiva comunicação mediúnica adequada.
Baseado nisso ficam algumas perguntas:
a) Se o receptor estivesse em estado alterado de consciência (transe), ele conseguiria conscientizar melhor a informação enviada?
b) Qual a ligação do inconsciente com o cérebro em si? O cérebro reagiu/sinalizou o inconsciente?
c) O indivíduo transmissor enviaria melhor a informação se estivesse dormindo? (evocação por parte do receptor para saber o que ocorria na tela de um monitor na sala de experimentação)
Se havia uma lacuna ainda não respondida adequadamente pelo espiritismo, agora temos outra.
Essa, com certeza, está relacionada com a primeira mas talvez possa trazer melhor reflexão sobre a temática.
Dentre os fatos abordados nesse breve artigo, não podemos abdicar de que ambos os casos implicam em comunicação entre vivos, mesmo se utilizando do termo telepático ou comunicação mediúnica. Se a essência do espírito reflete mais o inconsciente, então talvez esse seja um caminho possível a se investigar mais profundamente.
Por outro lado, se o envio de informação, mesmo que consciente, implique na recepção do inconsciente e exista a necessidade do envio disso para o estado de vigília, então as “coisas” não estão tão separadas assim como se pensa.
Os fatos até o momento apontam para uma inconclusão frente às comunicações mediúnicas em estado de vigília. As revisões bibliográficas, abundantes pela maioria dos estudiosos espíritas, não são suficientes para se optar por alguma certeza sobre esse tema (e muitos outros). Nesses casos apenas pesquisas de campo podem ser adequadas para melhor responder a essas questões.

[1] Revista Ciência Espírita - Junho/2017
[2] Jornal de Estudos Espíritas – Volume 3 / 2015 – Seção 2 – Manifestação de Espírito de Pessoa Viva: é possível em estado de vigília?

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