Quando se dispôs Leonarda à nova
reencarnação, Lucinda, a nobre amiga espiritual que permaneceria na esfera
superior, recomendou:
— Leonarda, minha irmã, grandes
tesouros tem conseguido você, nos caminhos da vida, e suas aquisições de
virtude prosseguem no ritmo desejado. No entanto, sua provisão de paciência é
muito escassa. Seu atraso, nesse terreno, é particularmente lamentável, provocando
enorme desarmonia no admirável conjunto de suas qualidades pessoais. Faça o possível
por elevar o padrão de sua resistência pela intensificação do autodomínio. As realizações
do Espírito não são gratuitas. Constituem patrimônio eterno, adquirido a preço alto,
em esforço e experiência. Tenha coragem nessa edificação. Quando na Terra, olvidamos
frequentemente a real significação do desassombro. Aplaudimos a impulsividade animal,
esquecendo a sabedoria da prudência. Agora, porém, minha amiga, felicitadas
pelas bênçãos de Jesus, busquemos o entendimento necessário, aprendendo a
vencer sem armas visíveis, nos combates silenciosos do coração, no recinto do
lar, onde o sacrifício é sempre mais vivo e mais proveitoso. Em voltando
presentemente à carne, não olvide que a renúncia é a mestra da paciência.
Leonarda ouvia com interesse,
revelando no olhar a preocupação indisfarçável do aprendiz que regressa à
escola terrena.
Transcorrida ligeira pausa, a
amiga continuou:
— Sabemos que existe alimentação
e assimilação, estudo e aproveitamento, dor e renovação. Esgota-se o corpo
físico, quando se alimenta e não assimila. Entrega-se o estudante a muitos
disparates, quando lê e não medita. Precipita-se a alma em regiões infernais,
quando sofre e não recolhe os valores da lição. Lembre-se de semelhantes verdades
na Terra. Para nós, que muitas vezes fomos injustas para com o próximo, o melhor
método de adquirir a paciência é o de sermos justas para com os outros, sem
exigir que outros o sejam para conosco. Essa indicação, aliás, vem de Jesus,
desde o processo que o conduziu à crucificação. O Mestre foi sumamente bom para
com todos; entretanto, não reclamou qualquer manifestação de justiça para
consigo mesmo, nos grandes momentos. E Ele era puro, Leonarda! Não desejo, de
modo algum, induzi-la a desconsiderar a retidão.
Examino apenas o aproveitamento
da oportunidade. Tolo é o doente que despreza o remédio. E já que somos antigas
enfermas, não fujamos à medicação adequada. Tenha cuidado e dê a cada um o que
indiscutivelmente lhe pertença. Contudo, se houver atraso na recepção do que
lhe couber, não descreia do Equilíbrio Divino, valendo-se do ensejo para enriquecer
a sua capacidade de resignação para o bem. Isso representa negócio espiritual de
grande importância para o futuro. Quanto ao mais, saiba você que estaremos ao
seu lado, assistindo-a com amor. De seu concurso, depende a realização.
Leonarda prometeu observância
aos conselhos ouvidos, e assumiu compromissos graves e tornou à Terra.
No entanto, apesar dos ajustes
havidos, desde criança revelou extrema inquietude e frequente indisciplina.
No fundo, era bondosa e
sensível, mas navegava facilmente da calmaria à tormenta.
Chegada à juventude, o plano
espiritual convocou-a, pouco a pouco, às provas de paciência de que
necessitava.
Leonarda casou-se, mas no
aparecimento do primeiro filhinho começaram os serviços mais duros. Cristóvão,
o marido, na condição de espiritualista, proporcionava-lhe o melhor quinhão de
assistência; no entanto, a companheira parecia surda a todas as advertências
alusivas à conformação e à tolerância. Não obstante a sua nobre dignidade de
esposa e mãe, descontrolava-se ao primeiro sinal de luta mais forte. Cessada e
borrasca doméstica, lavava-se em pranto de arrependimento, reconsiderando
atitudes; mas, quantas vezes fosse visitada pela contrariedade ou pela
tentação, quantas caía Leonarda em desespero e revolta, em razão da
invigilância.
Convertia as moléstias mais
simples em fantasmas horríveis e transformava os mínimos dissabores em
tragédias comoventes. Dentro de semelhante clima sentimental, os filhos andavam
enfermiços, o esposo, inquieto, e a residência, menos cuidada.
Leonarda, conquanto bondosa, não
sabia trabalhar nem descansar. No serviço, mantinha-se impaciente; no repouso,
vivia atormentada. Agia muito longe da tranquilidade operosa que produz a
segurança íntima. O companheiro, por sua vez, não conseguia torná-la em confidente
de suas naturais aventuras e questões. Leonarda não sabia como analisar serenamente
os problemas. Contrariava sistematicamente tudo o que lhe não proporcionasse
bem-estar.
Nas reuniões evangélicas, ouvia
importantes preleções sobre humildade e coragem, costumando observar:
— As pessoas infelizes quanto eu
não podem ser conformadas.
E, como se a virtude fosse algo
insustentável, repetia sempre:
— Muito consoladores são os
elementos da fé, mas perco a paciência todos os dias. Se a dor, no entanto,
vale alguma coisa para a melhoria da alma, estou sinceramente confortada, porque
os meus sofrimentos têm sido infindáveis.
Nessa diretriz prejudicial,
atravessou o estágio terrestre.
Sem dúvida, efetuou louváveis
aquisições nos sacrifícios do lar; todavia, quanto à resignação, nunca obteve o
mais leve traço. Chorou, reclamou, protestou e reagiu, sempre que assediada
pelos dissabores comuns. A pior característica em seu caso, porém, é que Leonarda
jamais se inquietou com o bem dos outros, mas, sim, com a satisfação de si mesma,
incapaz de suportar o menor espinho.
Ao terminar a tarefa terrena,
Lucinda esperava-a com a mesma serenidade dos outros tempos.
Abraçaram-se comovidas, logo que
a memória de Leonarda recuperou as recordações, permutando os júbilos de
amizade sincera.
Depois das primeiras impressões
afetuosas, falou a amiga espiritual:
— É lamentável tenha você
demorado tanto tempo na oficina, sem melhorar a obra.
— Como assim? — indagou a
interlocutora, assombrada.
— Refiro-me à paciência —
comentou Lucinda, carinhosa —; cada vez que a Bondade Infinita aproximava o seu
coração do precioso manancial das oportunidades, você recuava apressada,
recusando-me o auxílio. Tentei quinhoar-lhe a senda com inestimáveis recursos educativos,
mas, infelizmente...
Espantou-se Leonarda, ao ouvir
as inesperadas considerações, e, com inexcedível desencanto, acentuou, triste:
— Que diz? Fui excessivamente
provada!...
— Mas não foi aprovada —
explicou a amiga, serena.
— Vivi com a pobreza e a
dificuldade...
— Entretanto, não as aproveitou
convenientemente.
— Experimentei muitas dores...
— Todavia não guardou os
ensinamentos.
— Sofri muito!
— Mas não aprendeu...
E, porque a interlocutora
emudecesse desapontada, Lucinda concluiu:
—Você falhou nas provas de
paciência que o aprendizado humano lhe ofereceu, mas não desespere de novo...
Haverá recurso para recomeçar.
[1] Pontos e
Contos – pelo Espírito Irmão X –
psicografado por Francisco C. Xavier
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