Agência Fapesp - 09/01/2017
Inteligência do bem ou do mal
Hoje estamos publicando dois
artigos com diferentes abordagens sobre a Inteligência Artificial: um otimista
e entusiasmado, quase ufanista, e outro mais cauteloso, preocupado, quase
pessimista. É comum que os apaixonados por tecnologia identifiquem-se quase
naturalmente com o primeiro enfoque, mas é importante não perder de vista as
responsabilidades e os novos desafios que todos os progressos trazem. O ideal é
que a abordagem responsável não iniba os sonhos da visão apaixonada e que o
ideal de um futuro mais promissor não se esqueça de que, para deixarem de ser
meras fantasias, os sonhos precisam firmar resolutamente os pés no solo da
realidade.
Perdendo o controle
da tecnologia
De veículos autônomos a fábricas
e cidades inteligentes, a humanidade está construindo sistemas computacionais
dinâmicos cada vez mais complexos, que trabalham em rede com alto grau de automação
e de autonomia.
O grande medo é que, nesse
grande mundo interconectado que se avizinha, os humanos tornem-se meros
usuários desses sistemas dinâmicos complexos, e não mais a força que os
controla.
Para o professor Frank Allgöwer,
da Universidade de Stuttgart, na Alemanha, somente com um grande esforço em
pesquisa básica, particularmente na área de engenharia cibernética, será
possível desenvolver mecanismos de controle para garantir que tudo funcione de
maneira adequada - e, sobretudo, que nada saia do controle humano.
"Ainda não entendemos muito
bem como esses sistemas funcionam, como interagem e se organizam, mas ainda
assim os estamos construindo. Embora pense que os efeitos positivos devem
superar os negativos, fico hesitante em dizer que devemos acelerar nosso
desenvolvimento tecnológico. Creio que este seria o momento de fazer a pesquisa
básica alcançar as inovações tecnológicas que estão surgindo para que possamos
realmente entender o que está acontecendo", ponderou Allgöwer durante uma
palestra em São Paulo, promovida pela Fapesp.
Engenharia
cibernética
De acordo com o pesquisador
alemão, a autonomia crescente e a estrutura em rede são as
características-chave das inovações tecnológicas atuais. E a engenharia
cibernética é a ciência básica que está no centro desse processo,
possibilitando, por meio de métodos matemáticos e teoremas, prever o
funcionamento desses sistemas complexos e influenciar seu comportamento.
"Controlar um sistema
dinâmico - como, por exemplo, um carro autônomo - é uma tarefa difícil, nada
trivial. Requer, portanto, uma boa base teórica. Mas esse não é o fim da linha.
No futuro, haverá muitos carros autônomos e eles terão de se organizar e
conversar entre si, de modo a otimizar o trânsito, poupar energia, tempo e
evitar acidentes. Essa rede terá de ser operada por controladores cibernéticos,
pois nenhum humano consegue reagir rápido o suficiente para gerir uma rede tão
complexa e da qual muitas vidas dependem," exemplificou Allgöwer.
O sonho da inteligência
artificial continua cada vez mais vivo, mas um número cada vez maior de
especialistas teme uma revolução das máquinas.
Do mesmo modo, nesse futuro a
geração de energia não será mais concentrada em grandes usinas, e sim
distribuída em pequenas unidades individuais e até domésticas, formadas por
geradores eólicos ou solares interconectados. Essas unidades terão de se
organizar de modo a enviar energia onde há demanda, evitando falhas e
interrupções no fornecimento.
Já nas fábricas, as linhas de
montagem introduzidas na segunda revolução industrial estão dando lugar a
estações de manufatura estruturadas em redes. "Na indústria 4.0, se o robô
de uma determinada estação quebrar ou estiver sobrecarregado, outro assume sua
função e, nesse sistema interconectado, é possível produzir mercadorias de
forma mais barata e eficiente," disse.
Papel das ciências
humanas
Para Allgöwer, a crescente
autonomia dos sistemas dinâmicos é, em princípio, algo positivo, devendo
beneficiar a economia, os meios de trabalho, aumentar a qualidade de vida e a
eficiência no uso de recursos, tornando as atividades humanas mais
sustentáveis.
Porém, pode haver perigos
associados.
"Esses sistemas são tão
complexos que os seres humanos não têm como acompanhar tudo o que está
acontecendo. Os robôs terão todo o conhecimento sobre nós e vão influenciar
tudo o que fazemos. Poderiam essas máquinas assumir o controle da
sociedade?", indagou.
Para responder a questões como
essa, segundo Allgöwer, além de pesquisas em engenharia cibernética também
serão necessários estudos em áreas como filosofia e ciências sociais.
"É preciso que
pesquisadores da área de humanas supervisionem o que os engenheiros estão
construindo", recomendou ele.
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