Mais importante do que ser
tolerado é ser tolerante. Quando os educadores, os pais, na teoria e na
prática, exemplificarem este tópico aos mais novos, as mentalidades melhorarão.
A ausência da tolerância quase
sempre dá lugar à agressividade. Venha esta na embalagem violenta do fanatismo
religioso ou da xenofobia. Por exemplo, a meio deste ano ocorreu o crime
racista do Bairro Alto. Os órgãos de comunicação social empolaram-no tanto, ao
repetirem a notícia diariamente, que, dias depois do homicídio, um mancebo no
cumprimento do serviço militar obrigatório (careca por disciplina marcial)
levou pancada de criar bicho ao ser tomado como skin-head (cabeça-rapada racista). Esta vertente foi explorada à
exaustão, sem haver uma análise demonstrativa do potencial de perigo que
encerra também o fanatismo religioso, que é quase sempre proselitista.
Aprender a pensar
As decisões emocionais rebentam
rápidas como torrentes. Sem a participação do bom senso, são capazes de
danificar a harmonia de muita gente. Essas atitudes veem-se no dia a dia de
muitas pessoas com dificuldade em articular raciocínio com alguma clareza,
dentro e fora do movimento espírita. Apesar de saberem somar 2 + 2 ou até 1500
+ 1353, não distinguem as águas apaixonadas das suas opções, incapazes de perceberem
que é conveniente para si próprias e para todos canalizá-las, sem
pseudoargumentos, através da via da sensatez, da capacidade e da possibilidade
de pensar. São os fanáticos, mais ou menos camuflados.
Já para não referir as seitas
milagreiras, por exemplo, que se regem pelo apelo emocional, em que a razão
sofre um demorado ocaso, veja-se algo mais clássico: nessa altura do crime
racista, no norte, numa aldeia para as bandas da serra do Caramulo, o fanatismo
religioso ficou à margem das notícias. Mas a intolerância vertida em forma de
violência, por parte de crentes da religião tradicional, contra uma ali
recém-instalada religião evangélica (minoritária, claro) ocorreu e gerou
vítimas. Houve ofensas corporais, contando-se entre os atingidos uma criança. A
queixa infelizmente não foi apresentada, pois as vítimas, na certa por
entenderem que era assim que deviam vivenciar a sua convicção, acharam
preferível não o fazer.
Espíritos tolerantes
Quando ponderávamos sobre o
gosto de beneficiar da tolerância alheia, alguém nos disse que para uma
criatura ter necessidade de ser tolerada basta ser nem mais nem menos do que
parvo. Para tolerar, é preciso ter algo mais: alguma capacidade de dar. De dar
na ciência e na arte de se ser tolerante.
Está-se longe de fazer a
apologia da manutenção de situações injustas que nos fazem sofrer ou a outrem.
Mas, a nível familiar, antes de
clamar pela tolerância alheia mais importante talvez seja aferir até que ponto
temos sido tolerantes. Por que não passar a ter isso presente? Uma forma de
semear este propósito é afirmar no imo do ser: “Dia após dia, eu sou mais
tolerante!”. É programação positiva, que serve mesmo para aqueles que se
consideram tolerantes.
Ano Internacional
A nomeação de 1995 como Ano
Internacional da Tolerância deveria servir para se refletir na prática dessa
virtude. Na verdade, em nós próprios temos feito algo nesse sentido? O mais
provável é que, se nos examinarmos bem, chegamos à conclusão de que sempre
poderemos ser mais tolerantes do que temos sido.
Que o processo de tolerar tenha
como efeito real a paz e a justiça.
É muito fácil ser tolerante com
quem não nos pisa os calos… Não escasseiam oportunidades. Começando por aí,
diante do ensejo de tolerar quem nos incomoda, não nos perturbemos e exerçamos
esse privilégio: tolerar. É forma de guardar a nossa paz. O caminho vai por aí.
Mas tolerar certas imposições
pode ser a aceitação de vida interior menor, que poderia crescer de uma forma
bem mais positiva. Há coisas que socialmente não são de tolerar, como a
violação dos direitos humanos ou a destruição do planeta. Aqui, porém, talvez
já não se trate de tolerância, mas de outras coisas diferentes. Há atitudes que
podem ser confundidas com tolerância. Se esta visa o interesse geral, o bem
comum, há comportamentos que, vestidos de pele de cordeiro, fazem o oposto. É o
caso da omissão, do comodismo, da pactuação ou do estímulo à asneira evidente.
Contudo, isso não é tolerar: o tolerante não é, de certeza, nem inconsciente
nem desinteressado. O poder de optar esteve sempre nas nossas mãos.
Tolerar é Diferente
Não confundir tolerância com:
Comodismo e desleixo – atitude de quem não quer saber de nada que
não seja andar ao sabor da corrente, entendendo que o leme de suas opções é
mero artigo decorativo.
Preguiça e inconsciência – atitude de quem não está “para se
chatear”, porque isso dá trabalho e às vezes até exige alguma abnegação. Uma
constante carência de perceber o que é essa coisa a que chamam
responsabilidade.
Ausência e omissão – carência de participação por timidez ou receio
de reações desfavoráveis que surgiriam se dissesse o que pensa, sobretudo
quando há abertura para o fazer. No fundo e na superfície, sempre, participação
igual a zero.
Conluio e pactuação – aguenta-se isso para se conseguir aquilo,
mesmo que não haja nenhuma afinidade de perspectiva, se bem que se partilhem
interesses mais ou menos casuais, com quem se pactua.
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