Não terminaremos este estudo da
vida no espaço sem indicar, de modo sumário, por que regras se efetua a
reencarnação.
Todas as almas que não puderam
libertar-se das influências terrestres devem renascer neste mundo para
trabalharem em seu melhoramento; é o caso da imensa maioria. Como as outras
fases da vida dos seres, a reencarnação está sujeita a leis imutáveis. O grau
de pureza do perispírito, a afinidade molecular que determina a classificação
dos Espíritos no espaço fixam as condições da reencarnação. Os semelhantes
atraem-se. É em virtude desse fato, dessa lei de atração e de harmonia que os
Espíritos da mesma ordem, de caracteres e tendências análogas aproximam-se,
seguem-se durante múltiplas existências, encarnando conjuntamente e
constituindo famílias homogêneas.
Quando chega a ocasião de
reencarnar, o Espírito sente-se arrastado por uma força irresistível, por uma
misteriosa afinidade, para o meio que lhe convém. É um momento terrível, de
angústia, mais formidável que o da morte, pois esta não passa de libertação dos
laços carnais, de uma entrada em vida mais livre, mais intensa, enquanto a
reencarnação, pelo contrário, é a perda dessa vida de liberdade, é um apoucamento
de si mesmo, a passagem dos claros espaços para a região obscura, a descida
para um abismo de sangue, de lama, de miséria, onde o ser vai ficar sujeito a
necessidades tirânicas e inumeráveis. Por isso é mais penoso, mais doloroso
renascer que morrer; e o desgosto, o terror, o abatimento profundo do Espírito,
ao entrar neste mundo tenebroso, são fáceis de conceber-se.
A reencarnação realiza-se por
aproximação graduada, por assimilação das moléculas materiais ao perispírito, o
qual se reduz, se condensa, tornando-se progressivamente mais pesado, até que,
por adjunção suficiente de matéria, constitui um invólucro carnal, um corpo
humano.
O perispírito torna-se,
portanto, um molde fluídico, elástico, que calca sua forma sobre a matéria. Daí
dimanam as condições fisiológicas do renascimento. As qualidades ou defeitos do
molde reaparecem no corpo físico, que não é, na maioria dos casos, senão
imperfeita e grosseira cópia do perispírito.
Desde que começa a assimilação
molecular que deve produzir o corpo, o Espírito fica perturbado; um torpor, uma
espécie de abatimento invadem-no aos poucos. Suas faculdades vão-se velando uma
após outra, a memória desaparece, a consciência fica adormecida, e o Espírito
como que é sepultado em opressiva crisálida.
Entrando na vida terrestre, a
alma, durante um longo período, tem de preparar esse organismo novo, de
adaptá-lo às funções necessárias. Somente depois de vinte ou trinta anos de
esforços instintivos é que recupera o uso de suas faculdades, embora limitadas
ainda pela ação da matéria; e, então, poderá prosseguir, com alguma segurança,
a travessia perigosa da existência.
O homem mundano chora e
lamenta-se à beira dos túmulos, essas portas abertas sobre o infinito. Se
estivesse familiarizado com as leis divinas, era sobre os berços que ele
deveria gemer. O vagido do recém-nascido não será um lamento do Espírito,
diante das tristes perspectivas da vida?
As leis inflexíveis da Natureza,
ou, antes, os efeitos resultantes do passado, decidem da reencarnação. O
Espírito inferior, ignorante dessas leis, pouco cuidadoso de seu futuro, sofre
maquinalmente a sua sorte e vem tomar o seu lugar na Terra sob o impulso de uma
força que nem mesmo procura conhecer.
O Espírito adiantado inspira-se
nos exemplos que o cercam na vida fluídica, recolhe os avisos de seus guias
espirituais, pesa as condições boas ou más de sua reaparição neste mundo, prevê
os obstáculos, as dificuldades da jornada, traça o seu programa e toma fortes
resoluções com o propósito de executá-las.
Só volta à carne quando está
seguro do apoio dos invisíveis, que o devem auxiliar em sua nova tarefa. Neste
caso, o Espírito não mais sofre exclusivamente o peso da fatalidade. Sua
escolha pode exercer-se em certos limites, de modo a acelerar sua marcha.
Por isso, o Espírito esclarecido
dá preferência a uma existência laboriosa, a uma vida de luta e abnegação.
Sabe que, graças a ela, seu
avançamento será rápido. A Terra é o verdadeiro purgatório. É preciso renascer
e sofrer para despojar-se dos últimos vestígios da animalidade, para apagar as
faltas e os crimes do passado. Daí as enfermidades cruéis, as longas e
dolorosas moléstias, o idiotismo, a perda da razão.
O abuso das altas faculdades, o
orgulho e o egoísmo expiam-se pelo renascimento em organismos incompletos, em
corpos disformes e sofredores.
O Espírito aceita essa imolação
passageira, porque, a seus olhos, ela é o preço da reabilitação, o único meio
de adquirir a modéstia, a humildade; concordam em privar-se momentaneamente dos
talentos, dos conhecimentos que fizeram sua glória, e desce a um corpo
impotente, dotado de órgãos defeituosos, para tornar-se um objeto de compaixão
e de zombaria. Respeitemos os idiotas, os enfermos, os loucos. Que a dor seja
sagrada para nós!
Nesses sepulcros de carne um
Espírito vela, sofre, e, em sua tessitura íntima, tem consciência de sua
miséria, de sua abjeção. Tememos, por nossos excessos, merecer-lhes a sorte.
Mas, esses dons da inteligência, que ela abandona para humilhar-se, a alma os
achará depois da morte, porque são propriedade sua, e jamais perderá o que
adquiriu por seus esforços.
Reencontrá-los-á e, com eles, as
qualidades, as virtudes novas colhidas no sacrifício, e que farão sua coroa de
luz no seio dos espaços.
Assim, tudo se apaga, tudo se
resgata. Os pensamentos, os desejos criminosos têm sua repercussão na vida
fluídica, mas as faltas consumadas na carne precisam ser expiadas da carne.
Todas as nossas existências são correlatas; o bem e o mal refletem-se através
dos tempos. Se embusteiros e perversos parecem muitas vezes terminar suas vidas
na abundância e na paz, fiquemos certos de que a hora da justiça soará e que
recairão sobre eles os sofrimentos de que foram a causa. Resigna-te, pois, ó
homem, e suporta com coragem as provas inevitáveis, porém fecundas, que
suprimem nódoas e preparam-te um futuro melhor. Imita o lavrador, que sempre
caminha para a frente, curvado sob um sol ardente ou crestado pela geada, e
cujos suores regam o solo, o solo que, como o teu coração, é sulcado pela
charrua destorroadora, mas do qual brotará o trigo dourado que fará a tua
felicidade.
Evita os desfalecimentos, porque
te reconduzirão ao jugo da matéria, fazendo-te contrair novas dívidas que
pesariam em tuas vidas futuras. Sê bom, sê virtuoso, a fim de não te deixares
apanhar pela temível engrenagem que se chama consequência dos atos. Foge aos
prazeres aviltantes, às discórdias e às vãs agitações da multidão. Não é nas
discussões estéreis, nas rivalidades, na cobiça das honras e bens de fortuna
que encontrarás a sabedoria, o contentamento de ti próprio; mas, sim, no
trabalho, na prática da caridade, na meditação, no estudo concentrado em face
da Natureza, esse livro admirável que tem a assinatura de Deus.
[1] Depois da
Morte – Léon Denis
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