sábado, 10 de outubro de 2015

Evocação do momento em que Jesus nasceu entre os homens[1]




Dificuldades históricas quanto ao local e à data do nascimento – A festa de Mitra no calendário romano– Uma realidade que transformou e transforma o mundo.

O nascimento de Jesus tem dado motivo a muitas controvérsias. Ninguém, sabe, exatamente, em que dia ocorreu e, nem mesmo, em que localidade.
Os evangelhos não fixam nenhuma data, limitando-se a dar indicações vagas à época do nascimento. Esse fato foi motivo de grandes críticas ao cristianismo, não faltando escritores, historiadores e mitólogos que procuraram explicar o nascimento e a vida de Jesus como puramente lendários. Chegou-se a afirmar que Jesus não era mais do que o mito solar e seus doze apóstolos, os doze signos do zodíaco. Isso levou um escritor francês a afirmar, como réplica, que Napoleão e seus doze generais nunca haviam existido, sendo apenas uma idealização mitológica.
O Espiritismo considera Jesus como um ser histórico, um homem que realmente existiu. Mas não aceita as lendas que se formaram ao redor da sua figura singular e da sua vida extraordinária. Sabemos, por exemplo, que a data de 25 de dezembro só foi fixada em princípios do quarto século, exatamente quando se iniciava a deturpação do Cristianismo, e que essa fixação se deu em Roma. Vários historiadores admitem que essa data tenha sido escolhida de acordo com o calendário romano, por nela cair a festa do deus solar Mitra. É o que se pode ver em Jesus, de Ch. Guignebert, professor de História do Cristianismo, na Sorbonne, páginas 111 e 112, da edição de 1947, de Albin Michel, Paris.
Houve, durante muito tempo, várias datas consideradas pelos cristãos como prováveis: São Clemente de Alexandria, por exemplo, entendia que Jesus havia nascido a 19 de abril. Outros optavam pelo 18 de abril, o 29 de maio e o 28 de março. No oriente, diz Guignebert, o 6 de janeiro era geralmente aceito. Assim, a data de 25 de dezembro é apenas simbólica, não havendo acerto dessa escolha. Mas a verdade é que, firmada pela tradição, e apoiada num passado bastante longo de solenidades religiosas ao deus solar, essa data se mostra impregnada de intensas vibrações espirituais. Na terra, como no espaço, é nela que se comemora, há dezesseis séculos, o nascimento de Jesus, como foi nela que se comemorou, durante a antiguidade, o advento dos deuses simbólicos de várias mitologias.
Kardec, ao lançar O Evangelho segundo o Espiritismo, firmou o princípio de que os fatos históricos, e outras partes dos relatos evangélicos, estranhos ao seu conteúdo de ensinos morais, pouco importam para a doutrina. O que interessa ao Espiritismo não é a exatidão cronológica, mas a realidade da vida de Jesus e a legitimidade dos seus ensinos morais. Os espíritas, por isso mesmo, aceitam, sem relutância, a data de 25 de dezembro como marco tradicional do nascimento de Jesus, aproveitando-se para a evocação do momento em que o Senhor se encarnou entre os homens.
O que importa aos espíritas, no Natal, não é a celebração de um fato histórico cronologicamente assentado, mas a evocação de um acontecimento histórico da mais alta significação espiritual para a humanidade terrena. Se Jesus nasceu em Nazaré, como o indica Marcos, ou em Belém, como o dizem Mateus e Lucas, e se esse nascimento ocorreu em 6 de janeiro ou 25 de dezembro, isso pouco importa. O que importa é que ele tenha nascido, vivido e pregado entre os homens, mas, principalmente, que nos tenha deixado uma doutrina capaz de reformar o mundo, como realmente o reformou e continuará reformando.
A existência de Jesus está hoje suficientemente provada. Mesmo do ponto de vista histórico, apesar da falta de documentos a respeito, as pesquisas mais recentes demonstram que realmente viveu na Palestina e nela morreu o fundador do Cristianismo. Guignebert assinala a deturpação mitológica dessa figura humana, com o fim de torná-la extra-humana, divina, supranormal, “sacrificou Jesus ao Cristo”. E Henri Berr, no prefácio que escreveu para o livro de Guignebert, declara: “Mas Jesus existiu; isso, podemos dizer que o sabemos; a tese da não historicidade é um paradoxo”. Não é de admirar que, dois mil anos depois do seu nascimento, seja difícil precisar-se a data em que isso se verificou. Mas é de espantar que, depois da revolução que a sua figura e a sua doutrina produziram e continuam a produzir no mundo, ainda existam pessoas que as ponham em dúvida.


[1] O Mistério do Bem e do Mal – J. Herculano Pires – Correio Fraterno

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