Muitos temas considerados
polêmicos, como a redução da maioridade penal, estão agitando os debates em
vários segmentos da sociedade brasileira, com diferentes opiniões e
posicionamentos. Isso faz parte do saudável exercício democrático e da esperada
liberdade de expressão.
Há espíritas contrários e
favoráveis à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 171, que altera a redação
do art. 228 a respeito da imputabilidade penal do maior de 16 anos. Todas as
opiniões são respeitáveis e apresentam seus argumentos.
Muito mais, porém, do que se
ponderar prós e contras entre os espíritas, é preciso lembrar que um dos pontos
mais importantes e que permite, inclusive, o caráter científico da doutrina
espírita é o método do critério da universalidade dos seus postulados. Isso
permite que se acenda, no mínimo, uma luz amarela diante de qualquer opinião –
a favor ou contra – que se coloque como sendo representativa do espiritismo.
O Correio Fraterno abre esse
espaço para que se possa refletir sobre os dois posicionamentos, baseando-se no
critério adotado por Allan Kardec de respeito às opiniões. "Se emitirmos
nosso ponto de vista, isso não é senão uma opinião individual que não
pretenderemos impor a ninguém. Nós a entregaremos à discussão e estaremos
prontos para renunciá-la, se nosso erro for demonstrado", ensinou ao
lançar o primeiro número da Revista Espírita em 1858.
Outro ponto fundamental a ser
considerado é que, como lembrou o pesquisador espírita Ademir Xavier, em seu blog
A era do espírito, a maturidade nem sempre está relacionada à idade cronológica
e que, nos tempos modernos, não compete mais a nenhuma religião ou doutrina
alterar leis humanas." Isso acontecia no passado por força da importância
que a religião tinha dentro do Estado e vice-versa. No caso do espiritismo, as
respostas dadas pelos Espíritos dizem respeito à lei natural e sua justiça e
não poderão ser extrapoladas nem copiadas para a lei humana". Acrescenta
ele ainda que "o espírita que quiser contribuir para o debate sobre a
redução da maioridade penal não deve se esquecer da importância da educação
infantil, da missão da paternidade, da necessidade de aprimorar o conhecimento
sobre a psicologia humana, da existência no mal no coração de mentes perversas recém-
encarnadas e da infinita capacidade do amor no resgate desses corações
desviados".
Vale a pena refletir sobre o
tema e tirar suas próprias conclusões. Será esse um problema para o
espiritismo? Será que cabe a ele dar a palavra final sobre os particulares das
legislações humanas?
CONTRA[1]
Políticas públicas
devem buscar a emancipação do ser
A AJE-Brasil ¬–Associação
Jurídico-Espírita do Brasil, por ocasião do 1º Fórum de Reflexões, promovido em
7 e 8 de fevereiro de 2015, na Federação Espírita Brasileira (FEB), em
Brasília, deliberou ser contrária ao Projeto de Emenda Constitucional (PEC
171/93), que pretende reduzir a maioridade penal no Brasil, fixando-a a partir
de 16 anos, pelos seguintes motivos:
1.
O Brasil é signatário da Convenção dos Direitos da Criança de 1989, da ONU, que reconhece
que a criança – indivíduo menor de 18 anos – é merecedora de cuidados especiais
e de proteção, por conta de sua falta de maturidade física e mental;
2.
O adolescente – indivíduo de 12 a 18 anos
incompletos segundo a legislação brasileira – é um ser cuja personalidade está
em desenvolvimento físico, mental, moral e espiritual, devendo lhe ser
garantido o sistema de maior proteção aos direitos fundamentais;
3.
Para a hipótese de condutas definidas como
crime, o sistema jurídico brasileiro, por meio do Estatuto da Criança e do Adolescente, já prevê medidas
socioeducativas para a adequada responsabilização do adolescente, não havendo
que se falar em impunidade;
4.
Ao invés de se adotar o sistema punitivo de
natureza penal a adolescentes de 16 a 18 anos, cumpre ampliar medidas concretas
nas áreas de assistência social, moradia, esporte, lazer, saúde, educação,
entre outras;
5.
A inserção de adolescentes no sistema carcerário
– que se apresenta superlotado, em condições subumanas, portanto, sem estrutura
mínima para cumprir o fim de ressocialização da pena e para atender à dignidade
da pessoa humana – implica aumentar os efeitos deletérios desta realidade, com
prejuízo para o cidadão e para sociedade em geral;
6.
Dados estatísticos comprovam que a maior
incidência da lei penal dá-se em relação a adolescentes pobres, negros e com
baixo grau de alfabetização, o que revela a seletividade do sistema punitivo.
De outro lado, o número de crimes praticados por adolescentes é baixo, em torno
de 0,1425% (IBGE);
7.
As políticas públicas devem buscar a emancipação
do ser – em especial do adolescente que se encontra em desenvolvimento – em
detrimento do aumento de medidas repressivas, o que se faz por meio da
educação, que proporciona o aperfeiçoamento moral e intelectual do espírito
imortal;
8.
A lei humana deve privilegiar a ampliação e não
a restrição dos direitos fundamentais, visando à construção de uma sociedade
justa e fraterna;
9.
A educação deve ser vista como prioritária e
permanente opção para a evolução humana. Logo, a proposta em debate – de
aumento de medida repressiva em prejuízo da adoção de medida de natureza
educativa – se aprovada, representa retrocesso social e espiritual para os
destinos da sociedade brasileira. (Brasília, abril de 2015).
A FAVOR[2]
A dureza da leis é
proporcional à condição evolutiva da sociedade
Por Adilson Alves de Souza[3]
Todos nós reencarnamos para
continuar a nossa jornada evolutiva e nesse breve período na Terra temos a
oportunidade de manifestar todas as virtudes já conquistadas e, principalmente,
de enfrentar e vencer os nossos próprios defeitos com coragem e disciplina.
Afinal, ninguém está aqui de férias e cabe a nós superarmos todos os desafios
que favorecem o fortalecimento do ser. A cada um segundo as suas obras e somente
pelo próprio esforço galgaremos patamares espirituais mais elevados.
A convivência mútua nos propicia
experiências valiosas para o burilamento individual. Aprendemos com os nossos
erros e muitas vezes as dores e sofrimentos entram em nossas vidas não como
punição, mas como prova da bondade divina para nos alertar sobre o mal que
estamos fazendo.
A sociedade é o reflexo do nível
moral de seus membros. Se aparentamos viver tempos ainda próximos à barbárie,
com guerras e violências de toda ordem, é porque ainda temos muito o que fazer
para realizar o potencial da perfeição espiritual que carregamos. A dureza das
leis, por sua vez, é proporcional à condição evolutiva da maioria dos cidadãos.
É uma consequência natural.
Conforme observamos no Código
Penal da Vida Futura, apresentado no capítulo VII do livro O céu e o inferno,
cada um é responsável por suas ações e sofrerá as devidas consequências para
valorizar o que é preciso. Sofremos porque agimos mal contra o próximo ou
contra nós mesmos.
No Brasil, atualmente,
discute-se a proposta de redução da maioridade penal para indivíduos de 16
anos. Há espíritas favoráveis e contrários. É plenamente compreensível haver
divergências de opiniões em leis humanas e transitórias.
A maioridade, seja penal ou
civil, é uma convenção adotada em cada país, com variações entre os mesmos.
Cada indivíduo age de acordo com a sua maturidade e, se alguns ainda agem em
detrimento de um grupo ou sociedade, ele deve ter a oportunidade de ser educado
e não prejudicar ainda mais a própria sociedade que o acolhe, ainda que tenha
que ficar recluso.
Sou um dos 87% dos cidadãos
brasileiros, conforme pesquisa recente do Datafolha, favoráveis à respectiva
redução da maioridade penal, não por entendê-la como solução definitiva para a
criminalidade crescente neste país, mas por uma questão óbvia de que aquele que
sabe discernir entre o certo e o errado, entre o legal e o ilegal, deve
responder por seus próprios atos. Se um jovem de 16 anos pode votar e ajudar a
escolher os destinos da nação, ele sabe o que está fazendo e tem discernimento
sobre o certo e o errado.
Um aspecto muito importante,
levantado pelo psicanalista Contardo Calligaris, é a idealização alienada de
parcela da população sobre uma suposta "pureza" da infância. Essa
idealização prejudica o próprio amadurecimento do indivíduo, infantilizando
seres que terão dificuldades de se tornarem adultos. Calligaris, por sinal, é
contra a existência de maioridades e menoridades penais, seja qual for a idade
fixada, pois o que vale é o discernimento do indivíduo.
Aqueles que argumentam contra a
redução costumam afirmar que a prisão de criminosos de 16 e 17 anos fará com
que sejam recrutados por grupos organizados de criminosos. Ora, muitas crianças
e jovens já são aliciados por esses grupos nas ruas, justamente porque a idade
os favorecem perante a lei penal atual.
É primordial a adoção de medidas
educativas para o aperfeiçoamento moral dos seres, tanto de curto quanto de
longo prazos. Não basta o simples discurso normativo de que se deve investir na
infância e que se precisa mais de escola do que de cadeias se o imobilismo
continuar. A redução da maioridade penal é uma proposta real para o estágio em
que nos encontramos. Tomara que cheguemos, um dia, a não precisar de leis
punitivas para mais ninguém, porém isso depende do próprio nível evolutivo dos
habitantes deste planeta.
Allan Kardec. O céu e o
inferno. Brasília: FEB, 2005.
[3] Pesquisador graduado em física, profissional da
Secretaria da Saúde de São Paulo.
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