Já se sabe que
os fenómenos envolvendo a mediunidade não são recentes, mas que têm sido
registrados desde os tempos mais antigos da civilização. A Igreja também
reconheceu o fenómeno, e muitos papas estiveram envolvidos em ocorrências
mediúnicas.
Em 18 de Abril
de 2005, ocorreu a eleição de Joseph Ratzinger (1927), o novo papa da Igreja
Católica Apostólica Romana, que adoptou o nome Bento XVI, em substituição a
Karol Wojtyla (1920-2005), chamado papa João Paulo II.
Aproveitaremos
a oportunidade para destacar a mediunidade e a comunicabilidade dos Espíritos,
presentes entre os papas desde a origem do papado e ao longo de sua história de
quase dois mil anos. Tínhamos ouvido referência de fenómenos espirituais com
Pio V e Pio XII, em palestras do médium Divaldo Franco (1927-), e quisemos
aprofundar e completar o assunto.
Consultando a
historiografia católica sobre a origem doutrinária do papado, o imperador
romano Constantino (272-337) é apontado entre os teólogos como um dos seus
principais precursores, pois foi ele quem historicamente começou a dar forma ao
Sistema Católico Romano. Constantino presidiu o 1º Concílio das Igrejas, no ano
313, construindo depois a primeira basílica em Roma, tornando o cristianismo
religião oficial do Império, seguido de Teodósio (347-395) e outros
imperadores.
Começava-se a
criar os fundamentos que possibilitaram que Valentiniano III (Flávio Plácido,
419-455), no ano 445, reconhecesse oficialmente ao papa (a palavra
"papa" significa pai) o exercício de autoridade sobre as Igrejas,
ganhando o papado poder mundial com Carlos Magno (747-814), no século 8.
Ocorre que
Constantino, que os católicos consideram como o precursor da estruturação
papal, converteu-se ao cristianismo através de uma visão espiritual, conforme
relatou o historiador católico Eusébio de Cesareia (275-339), em sua obra Vita
Constantini (Cap. XXVIII). Durante a batalha contra o imperador Maxêncio (séc.
3/4), com seu exército em desvantagem, Constantino viu no céu um grupo de
Espíritos, liderados pelo Espírito (chamado Anjo) São Miguel, mostrando-lhe uma
cruz luminosa com os dizeres: "Com este sinal vencerás".
O impacto que
sentiu foi tão grande que mandou pintar uma cruz em todas as bandeiras, venceu
a batalha e se converteu ao cristianismo, estabelecendo o famoso Edito de
Milão, do ano de 313. O escritor Nicéforas (séc. 16) escreveu que Constantino
viu este Espírito mais duas vezes - numa delas, orientando-o a edificar
Constantinopla; e, na outra, para ajudá-lo numa revolta por parte dos moradores
da antiga Bizâncio.
Portanto,
encontramos visões espirituais nos primórdios da estruturação da Igreja e da
criação do papado.
Encontramos
exemplos de mediunidade dos papas numa ocorrência com António Michele Ghislieri
(1504-1572), o papa Pio V, que foi o Sumo Pontífice no período de 1566 a 1572.
Em 1570, os turcos otomanos invadiram a ilha de Chipre e tomaram Veneza, e os
venezianos pediram ajuda. O papa Pio V enviou uma frota de 208 navios, sob o
comando de Don John da Áustria. Essa frota encontrou 230 navios turcos em
Lepanto, Grécia, em 7 de Outubro de 1571. A batalha durou três horas. Miguel de
Cervantes (1547-1616), o novelista espanhol, autor de D. Quixote, participou
dessa batalha histórica. Em Roma, Pio V aguardava notícias, orava e jejuava,
juntamente com monges, cardeais e fiéis. Em 7 de Outubro, ele trabalhava com
seu tesoureiro, Donato Cesi, que lhe expunha problemas financeiros. De repente,
separou-se de seu interlocutor, abriu uma janela, entrou em êxtase e teve uma
visão em desdobramento espiritual. Voltou-se para Donato e lhe disse: "Ide
com Deus. Agora não é hora de negócios, mas sim de dar graças a Jesus Cristo,
pois nossa esquadra acaba de vencer a batalha". Duas semanas depois
chegaram as notícias da vitória de sua esquadra, confirmando sua visão espiritual.
Mais
recentemente, no século 20, encontramos outro exemplo de ação espiritual entre
os papas, com o Cardeal Eugénio Pacelli (1876-1958), que viria a ser o papa Pio
XII, no período de 1939 a 1958. O fato foi relatado pela própria Igreja
Católica, em seu jornal oficial L'Observatore Romano, e depois publicado no
Brasil, no jornal Ave Maria, de Petrópolis, transcrito pelo Jornal do Comércio,
do Rio de Janeiro, em Setembro de 1956.
Em 19 de
Fevereiro de 1939, nos aposentos do Vaticano, na ala esquerda da Catedral de
São Pedro, o cardeal Eugénio Pacelli estava orando; ele era um diplomata da
Santa Sé junto aos governos do Ocidente. Em seus aposentos de cardeal, ele
ouviu uma voz chamando: "Pacelli, Pacelli". Ele se voltou e viu o
Espírito do papa Pio X (1835-1914). Emocionado, ele se ajoelhou e chamou-o de
Santidade. O Espírito respondeu-lhe: “Não sou Santidade, mas apenas um irmão;
venho avisá-lo que, dentro de alguns dias, se tornará papa, e que a Terra será
devorada por uma avalanche de tragédia”.
“É da vontade
do Senhor que seja papa para governar a Igreja com sabedoria, bondade
diplomática e equilíbrio”.
O cardeal
Eugénio Pacelli redarguiu dizendo que não entendia aquilo, porque Pio XI
(1857-1939) era o papa de então, e governava a Igreja com sabedoria. O Espírito
Pio X não discutiu com o cardeal, desvaneceu-se.
Emocionado,
Eugénio Pacelli desceu de seus aposentos e adentrou na Catedral de São Pedro.
Foi até o subterrâneo, onde estão os túmulos papais, ajoelhando-se na cripta de
Pio X, permanecendo em oração até o amanhecer. Ao raiar do dia, adentrou
novamente na Catedral de São Pedro, e um guarda suíço perguntou-lhe se estava
sentindo-se bem, pois estava muito pálido. Eugénio Pacelli respondeu que tinha
dialogado com Pio X. Surpreso, o guarda contrapôs que Pio X estava morto. Mas
Eugénio Pacelli disse que, naturalmente, o sabia, pois fora ele quem tinha
feito o discurso laudatório. Além do quê, Pio X tinha sido seu padrinho de
cardinalato.
Pio X disse-lhe
que ele seria papa e, em seguida, a humanidade entraria em guerra. O fato
permaneceu em sigilo, mas dois ou três meses depois, Pio XI morreu de uma
doença misteriosa. Eugénio Pacelli foi eleito o novo papa, Pio XII, e logo
depois eclodiu a Segunda Guerra Mundial, conforme lhe dissera o Espírito Pio X.
É mais um fato mediúnico, registrado pela história, de comunicabilidade
espiritual com os papas.
É interessante
registrar que não foi por acaso que Pio X apareceu em Espírito e se comunicou
mediunicamente com Pio XII. O papa Pio X conhecia os fenómenos espíritas, pois
seu médico, Dr. José Lapponi (1851-1906), foi uma pessoa interessada nos
estudos espíritas e até publicou um livro à época - Hipnotismo e Espiritismo
(1897) - aprovado pelo papa Leão XIII, e que foi traduzido e publicado no
Brasil pela editora da Federação Espírita Brasileira.
O Dr. Lapponi
também foi médico do papa Leão XIII (1810-1903). Vale anotar que, quando da
segunda edição do livro Hipnotismo e Espiritismo, em 1904, o periódico Diário
de Noticias, de Madri, do dia seis de Julho, publicou carta do Dr. Lapponi na
qual ele comentava que o órgão jesuíta La Civilitá Cattolica censurava seu
livro porque ele divulgava teorias que não eram aprovadas pela Igreja, e que o
próprio papa Pio X reprovara a obra. Mas à época, dom Eduardo Checci, redator
do Giornale d'Italia, foi entrevistado sobre isso, desmentindo que o papa Pio X
tivesse reprovado a obra. O Dr. Lapponi acrescentou que Pio X conhecia o
trabalho desde sua primeira edição e o tinha aprovado, e que o livro tinha
merecido louvores até do papa Leão XIII, que disse que a ciência católica não
devia ser contrária ao estudo do Espiritismo e suas manifestações.
É importante
esclarecer que o Dr. Lapponi não era espírita e, nesse livro, ele adotou uma
postura até de prevenção com relação aos fenômenos do hipnotismo e do
Espiritismo, porque poderiam ensejar fraudes e mistificações. Chega a ser
curiosa essa sua atitude, pois a verdade é que, se ele admitiu os fenômenos
espíritas (e, para nós, é o que importa), não se compreende por que ele recrimina
sua prática.
O Dr. Lapponi
demonstrou que não conheceu realmente o Espiritismo, uma vez que se ateve
somente à parte fenomênica; não conheceu a parte filosófica e ética da Doutrina
Espírita. Nem no aspecto fenomênico ele se aprofundou, pois só se referiu às
situações duvidosas; por temer fraudes e a ação de Espíritos brincalhões e
zombeteiros (que, portanto, ele admitia), achou temerário e perigoso ocupar-se
do Espiritismo.
Para nós vale
que o Dr. Lapponi, médico de dois papas, historiou a ocorrência de fenômenos
espíritas desde a Antiguidade e reconheceu a intervenção dos Espíritos no mundo
material.
A
transfiguração de Jesus é citada como exemplo de fenômeno mediúnico que aparece
na Bíblia, com Moisés e Elias aparecendo em espírito material. Ao final do
livro, ele afirmou que o Espiritismo só deveria ser estudado com as necessárias
precauções e por ação de pessoas reconhecidamente competentes (op.cit., pág.
219).
Portanto, a
Doutrina Espirita e os fenômenos mediúnicos transitaram pelo Vaticano no século
19, entre os papas e pelo médico que cuidou de dois deles nesse período e
escreveu um livro sobre o assunto, reconhecendo sua existência, apesar de sua
atitude de temor.
Mesmo nos
tempos mais recuados, os fenômenos mediúnicos estavam presentes na sociedade,
em todos os lugares, já que fazem parte da Natureza. Por isso, encontramos
referência a eles desde há dois mil anos. Basta citarmos o apóstolo Pedro, que
é considerado como o primeiro papa da Igreja. Na Bíblia, encontramos várias
ocorrências mediúnicas e de interferência dos Espíritos, ocorridos com Pedro.
Por exemplo:
a) em Mt: 17,
1-6, está descrita a transfiguração de Jesus na qual, estando Ele num monte,
acompanhado por Pedro, Tiago e João, apareceram, em Espírito, Moisés e Elias,
que já estavam mortos havia séculos, e conversaram com Jesus;
b) em At: 2,
1-14, ocorreu o fenómeno chamado Pentecostes, no qual os doze apóstolos ouviram
um som vindo do céu, como um vento, e como que línguas de fogo pousaram sobre
cada um deles, que então começaram a falar em diversos idiomas;
c) At: 3, 2-8,
é descrita a mediunidade curativa de Pedro, quando ele curou um coxo de
nascimento que todo dia ia à porta do templo para pedir esmolas. Ele tomou o
coxo pela mão e ordenou-lhe que se levantasse e andasse, e assim ocorreu;
d) At: 11,5-10,
Pedro teve um arrebatamento espiritual e teve vidência e audiência. Viu, a céu
aberto, um vaso que descia, como grande lençol atado pelas quatro pontas, vindo
para a terra, e ouviu uma voz: "Levanta-te Pedro, mata e come". Pedro
disse ao Senhor que nunca tinha comido coisa imunda. A Voz disse-lhe que não
devia chamar de imundo o que Deus purificou; isso se repetiu por três vezes;
e) At:11, 11-1,
Pedro viu três homens de Cesareia que o buscavam, e estavam em frente à casa
onde estava; um Espírito lhe disse que fosse com eles, nada duvidando;
f) At:12, 5-11,
Pedro estava dormindo na prisão, vigiado por dois guardas. Quando Herodes ia
chamá-lo, houve uma luz na prisão, e apareceu um Espírito (chamado anjo)
despertando-o, rompendo as correntes e dizendo-lhe para fugir; e conduziu-o,
fazendo-o passar pelos guardas, chegando à porta da cidade, pela qual saíram. E
Pedro percebeu que Deus havia enviado um Espírito para ajudá-lo.
Para encerrar
esse importante registro histórico sobre a mediunidade e seu reconhecimento
entre os papas, temos necessariamente que citar o recém-falecido papa João
Paulo II, reconhecido como um grande missionário do bem. A revista Veja, de 6
de Abril de 2005, na página 93, transcreveu uma frase pronunciada por ele numa
pregação na Basílica de São Pedro, em Novembro de 1983, e que dispensa
comentários: "O diálogo com os
mortos não deve ser interrompido, pois, na realidade, a vida não está limitada
pelos horizontes do mundo".
Portanto, fica
registrado, segundo as próprias fontes católicas e as não espíritas, que a
mediunidade e a comunicabilidade espiritual têm se manifestado e sido
reconhecidas pela Igreja, mesmo entre os seus maiores representantes, desde a
Antiguidade. E ainda hoje ocorre, demonstrando que a vida não se restringe à
realidade material nem é interrompida com a morte. a
Washington L.N.Fernandes -
Revista Espiritismo e Ciência
A revista Espiritismo e Ciência é uma
publicação da Mythos Editora:
Graduações em Teologia Espírita - Uma Reflexão
Fonte: Roseli Peressin (Blog
de Espiritismo)
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