Allan Kardec
Uma de nossas amigas, a Sra.
Schutz, que pertence a este mundo e que parece não querer deixá-lo tão cedo,
havendo sido evocada durante o sono, mais de uma vez deu-nos a prova da
perspicácia de seu Espírito em tal estado. Um dia, ou melhor, uma noite, depois
de uma longa conversa, disse:
Estou fatigada; tenho necessidade de repouso; estou
quase a dormir, meu corpo precisa descansar.
Diante disso, fiz-lhe notar o
seguinte:
Vosso corpo pode repousar; falando-vos, eu não o
prejudico; é vosso Espírito que está aqui e não o vosso corpo. Podeis, pois,
entreter-vos comigo, sem que o corpo sofra.
Ela respondeu:
Enganai-vos, pensando assim; meu Espírito se destaca um
pouco de meu corpo, tal como se fora um balão cativo retido por cordas. Quando
o balão é agitado pelo vento, o poste que o mantém cativo ressente-se dos
abalos transmitidos pelas amarras. Meu corpo representa o papel de poste para o
meu Espírito, com a diferença de que experimenta sensações desconhecidas do
poste e que tais sensações fatigam bastante o cérebro. Eis por que o meu corpo,
assim como o Espírito, necessita de repouso.
Conforme nos declarou aquela
senhora, durante a vigília jamais havia pensado em tal explicação, o que vem
mostrar perfeitamente as relações existentes entre o corpo e o Espírito,
enquanto este último desfruta uma parte de sua liberdade.
Sabíamos perfeitamente que a
separação absoluta só ocorre depois da morte e, até mesmo, algum tempo depois.
Jamais, porém, essa ligação nos havia sido descrita por uma imagem tão clara e
tão interessante. Por isso felicitamos sinceramente aquela senhora por haver
tão bem demonstrado as suas faculdades espirituais enquanto dormia.
Entretanto, para nós isto não
passava de uma comparação engenhosa; ultimamente, porém, a imagem tomou
proporções de realidade.
O Sr. R., antigo
ministro-residente dos Estados Unidos junto ao rei de Nápoles, homem muito
esclarecido sobre o Espiritismo, fazendo-nos uma visita perguntou-nos se, nos
fenômenos de aparição, já tínhamos observado uma particularidade distintiva
entre o Espírito de uma pessoa viva e o de um morto.
Numa palavra, se teríamos um
meio seguro de reconhecer se a pessoa está morta ou viva quando um Espírito
aparece espontaneamente, em vigília ou durante o sono. Ao responder-lhe que não
tínhamos outro meio senão perguntando ao Espírito, disse-nos que conhecia, na
Inglaterra, um médium vidente dotado de grande poder que, toda vez que se lhe
apresentava o Espírito de uma pessoa viva, notava um rastro luminoso que partia
do peito e atravessava o espaço, sem ser interrompido por nenhum obstáculo
material, indo terminar no corpo. Era uma espécie de cordão umbilical que unia
as duas partes momentaneamente separadas do ser vivo. Nunca o observou quando a
vida corporal já se havia extinguido e era por esse sinal que reconhecia se o
Espírito pertencia a uma pessoa morta ou a alguém que ainda vivia.
A comparação da Sra. Schutz nos
veio à mente e encontramos a sua confirmação no fato que acabamos de relatar.
Faremos, todavia, uma observação
a respeito.
Sabe-se que no momento da morte
a separação não é brusca; o perispírito se desprende pouco a pouco e, enquanto
dura a perturbação, conserva uma certa afinidade com o corpo. Não seria
possível que o laço observado pelo médium vidente, de que acabamos de falar,
persistisse ainda quando o Espírito aparece, no exato momento da morte, ou
poucos instantes depois, como acontece tantas vezes? Nesse caso, a presença do
cordão não seria um indicativo de que a pessoa estivesse viva. O Sr. R... não
soube dizer se o médium teria feito essa observação. Em todo caso, ela não é
menos importante e lança uma nova luz sobre aquilo que podemos chamar de
fisiologia dos Espíritos.

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