Allan Kardec
Continuamos a citar a brochura
do Sr. Blanck, redator do Jornal de Bergzabern[2].
Sabe-se que no quarto onde
dormia a mocinha, as cadeiras e os outros móveis muitas vezes eram derrubados,
as janelas abriam-se com estrondo, sob golpes repetidos. Há cinco semanas ela permanece
no quarto comum, onde, desde o princípio da noite, até a manhã seguinte, há
sempre uma luz; pode-se, pois, ver perfeitamente o que ali se passa. Eis o fato
observado sexta-feira, 4 de março:
Philippine ainda não estava
deitada; achava-se no meio de algumas pessoas que conversavam com o Espírito
batedor quando, de repente, a gaveta de uma mesa muito grande e pesada, que se
encontrava na sala, foi puxada e empurrada com grande barulho e com uma
impetuosidade extraordinária. Os assistentes ficaram fortemente surpreendidos
com essa nova manifestação; no mesmo instante, a própria mesa começou a
movimentar-se em todos os sentidos, avançando em direção à lareira, perto da
qual estava sentada Philippine. Por assim dizer, perseguida pelo móvel, viu-se obrigada
a deixar o seu lugar e correr para o meio do quarto; mas a mesa voltou-se nessa
direção e se deteve a meio pé da parede.
Colocaram-na em seu lugar
costumeiro, de onde não se mexeu mais; entretanto, as botas que se encontravam
debaixo dela, e que todos puderam ver, foram jogadas no meio do quarto, com
grande pavor das pessoas presentes. Uma das gavetas recomeçou a deslizar nas corrediças,
abrindo-se e fechando-se por duas vezes, de início muito vivamente e, depois,
de forma cada vez mais lenta; quando estava completamente aberta, acontecia ser
sacudida com estrondo.
Deixado sobre a mesa, um pacote
de fumo mudava de lugar a todo instante. As pancadas e arranhaduras eram
ouvidas na mesa.
Philippine, que então gozava de
excelente saúde, achava-se no meio das pessoas reunidas e de forma alguma
parecia inquieta com todas essas estranhezas, que se repetiam todas as noites,
desde sexta-feira; domingo, porém, foram ainda mais notáveis.
Por várias vezes a gaveta foi
puxada e empurrada com violência. Depois de haver estado em seu antigo
dormitório, Philippine voltou subitamente, foi tomada de sono magnético e deixou-se
cair numa cadeira, onde por várias vezes foram ouvidas as arranhaduras. Suas
mãos apoiavam-se sobre os joelhos e a cadeira ora se movia para a direita, ora
para a esquerda, ou para frente e para trás. Viam-se os pés dianteiros da
cadeira se erguerem, enquanto a cadeira balançava num equilíbrio impressionante
sobre os pés traseiros. Tendo sido levada para o meio do quarto, tornou-se mais
fácil observar esse novo fenômeno. Então, a uma palavra de ordem, a cadeira
girava, avançava ou recuava mais ou menos depressa, ora num sentido, ora
noutro. Durante essa dança singular os pés da criança arrastavam-se no chão,
como se estivessem paralisados; através de gemidos e levando a mão à fronte
diversas vezes, dava a entender que estava com dor de cabeça. Depois, despertando
de repente, pôs-se a olhar para todos os lados, sem compreender a situação: seu
mal-estar a havia deixado. Ela se deitou; então as pancadas e arranhaduras,
antes produzidas na mesa, fizeram-se ouvir no leito, com força e de maneira
divertida.
Pouco antes, tendo uma campainha
produzido sons espontâneos, tiveram a ideia de prendê-la à cama: logo se pôs a tocar
e a balançar. O que houve de mais curioso nessa circunstância foi o fato de a
campainha permanecer imobilizada e em silêncio, quando a cama era levantada e
deslocada. Por volta da meia-noite todo o ruído cessou e a assistência
dispersou-se.
Na segunda-feira à noite, 15 de
maio, prenderam ao leito uma grande campainha; imediatamente fez-se ouvir um
barulho desagradável e ensurdecedor. No mesmo dia, ao meio-dia, as janelas e a
porta do quarto de dormir foram abertas, mas de maneira silenciosa.
Devemos dizer, também, que a
cadeira em que se sentava Philippine, na sexta-feira e no sábado, levada pelo
Sr. Senger para o meio do quarto pareceu-lhe muito mais leve que de costume: dir-se-ia
que força invisível a sustentava. Querendo empurrá-la, um dos assistentes não
encontrou a menor resistência: a cadeira parecia deslizar por si mesma no
assoalho.
O Espírito batedor ficou em
silêncio durante três dias: quinta-feira, sexta-feira e sábado da Semana Santa.
Somente no Domingo de Páscoa os golpes recomeçaram, imitando o som de sinos;
eram ritmados e compunham uma ária. No dia 1º de abril, mudando de guarnição e puxadas por
uma banda de música, as tropas deixaram a cidade. Ao passarem diante da casa
dos Senger, o Espírito batedor executou, no leito, à sua maneira, o mesmo
trecho que era tocado na rua. Algum tempo antes, haviam escutado no quarto como
que os passos de alguém, e como se tivessem jogado areia no assoalho.
Preocupado com os fatos que
acabamos de relatar, o governo do Palatinado propôs ao Sr. Senger internar a
filha numa casa de saúde, em Frankenthal, proposta aceita. Sabemos que em sua
nova residência a presença de Philippine deu origem aos mesmos prodígios de
Bergzabern, e que os médicos daquela cidade, tanto quanto os nossos, não lhes
puderam determinar a causa. Além disso, estamos informados de que somente os
médicos têm acesso à mocinha. Por que tomaram essa medida? Nós o ignoramos, e
não nos permitimos censurá-la; porém, se o que lhe deu causa não foi o resultado
de alguma circunstância particular, pensamos que deveriam deixar entrar, perto
da interessante criança, se não todo o mundo, pelo menos as pessoas
recomendáveis.”
Observação – Só
tomamos conhecimento dos diferentes fatos aqui expostos pelo relatório que
deles o Sr. Blanck publicou; entretanto, uma circunstância acaba de nos pôr em
contato com uma das pessoas que mais se distinguiram nesse caso e que, a
respeito, houve por bem fornecer-nos documentos circunstanciados do mais alto
interesse. Através de evocação, obtivemos igualmente explicações bastante
curiosas e muito instrutivas desse Espírito batedor, dadas por ele mesmo. Como
esses documentos nos chegaram muito tarde, adiaremos sua publicação para o
próximo número.
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