Telma Maria Santos Machado − agosto/2023
O meu curso primário, em uma
escola pública estadual de Sergipe, foi marcado por livros de conteúdo lúdico:
as várias histórias que pulavam das páginas mágicas eram um convite à
imaginação de qualquer criança mais atenta às entrelinhas das mensagens, pois é
fato que, muitas vezes, o que está subentendido é a moral da história.
Em muitas delas viajei, ao lado da minha avó, sem sair do batente da
nossa casa.
Uma dessas lições marcantes
tinha dois personagens principais e toda a selva no papel de coadjuvante. Era
um leão, que insistia em perguntar aos demais moradores da floresta quem era o rei
da selva. Obviamente, que ele assim se julgava e, vaidoso, esnobava os
demais animais, dizendo-se o mais ágil e veloz.
Mas havia um animal, não tão
ágil, não tão veloz, nem tão arrogante. Tranquilo, como todo aquele que tem
segurança íntima da própria força, o elefante. Com um movimento, ele deitou por
terra toda a empáfia do felino: sem peripécias e sem cerimônia, pegou o Panthera
leo pela cauda, fê-lo rodar várias vezes, arremessando-o a uma distância
suficiente para vê-lo cair estatelado. Humilhação total para o animal de porte
nobre que se achava o dono da selva.
A primeira lição de humildade eu
aprendi com essa narrativa, nas páginas do livro cujo nome e autor não lembro.
Pena que nem todos tenham acesso, ainda na meninice, a histórias assim, e mais
penalizada fico dos que deixaram passar em branco a profunda lição que aí está
retratada.
É que o ego tem mecanismos bem
eficazes para fazer com que somente vejamos, ouçamos e assimilemos o que lhe
convém. Por isso precisamos vigiá-lo, para não cairmos no ridículo que o
supostamente poderoso leão caiu.
Mas, o que fazer para evitar
quedas tão desastrosas? Ora, um rápido olhar para algumas palavras de filósofos
e profetas, e teremos a profilaxia poderosa, o antídoto potente, a vacina
eficaz: a humildade.
Sócrates, dentre todos os
filósofos, através de uma frase, pontuou essa profilaxia para a Humanidade
orgulhosa e frágil, melhor dizendo, frágil e orgulhosa, pois é fato que o orgulho
provém de uma profunda fragilidade de mente, de alma e de espírito: Só sei
que nada sei. Um marco na filosofia que remete a uma necessária
autocrítica.
Alguns séculos depois, Jesus
conclamou a Humanidade de todas as épocas, através das palavras e exemplos, ao
sublime exercício da humildade.
No antigo Monte Eremos,
hoje denominado Monte das Bem-Aventuranças, também conhecido como Monte
das Beatitudes, o Mestre proclamou que todos aqueles que agirem com
humildade de espírito (pobres de espírito) serão bem-aventurados. Por pobres de
espírito deve-se entender aqueles que compreendem a necessidade de aprimorar o
Espírito cada vez mais, cientes de que a ascensão requer conhecimento e amor,
em outras palavras, sabedoria e bondade.
Pondera o Espírito Emmanuel[2]:
Através do amor
valorizamo-nos para a vida.
Através da sabedoria somos pela vida valorizados.
Daí o imperativo de marcharem juntas a inteligência e a
bondade.
Bondade que ignora é assim como o poço amigo em plena
sombra, a dessedentar o viajor sem ensinar-lhe o caminho.
Inteligência que
não ama pode ser comparada a valioso poste de aviso, que traça ao peregrino
informes de rumo certo, deixando-o sucumbir ao tormento da sede.
Todos temos necessidade de instrução e de amor. Estudar
e servir são rotas inevitáveis na obra de elevação.
Ainda Emmanuel assevera que[3]
A carência de humildade, que, no fundo, é
reconhecimento de nossa pequenez diante do Universo, faz surgir na alma humana
doentios enquistamentos de sentimento, quais sejam o orgulho e a cobiça, o
egoísmo e a vaidade, que se responsabilizam pela discórdia e pela delinquência
em todas as direções.
No fundo, estamos falando da
prepotência do leão frente aos demais animais. A palavra prepotente deriva do
latim praepotens, muito poderoso(a): de prae-, à frente, mais potens,
poderoso, de potere, poder, portanto, aquele(a) que coloca
o seu poder adiante, fazendo-o sobressair.
No caso do leão, falta-lhe, pela
sua condição na escala evolutiva, a sabedoria, que a nós é facultada, de
entender que a humildade, tal como assevera o Espírito Emmanuel, não se
confunde com servidão, mas sim independência, liberdade interior, cuja nascente
se encontra no âmago do Espírito, apoiando-lhe a permanente renovação para o
bem, portanto, cultivá-la é avançar sem se prender, é projetar o melhor de si
sobre os caminhos do mundo, não se podendo olvidar que, refletindo-a do Céu
para a Terra, em penhor de redenção e beleza, o Cristo de Deus nasceu na palha
da Manjedoura e despediu-se dos homens pelos braços da Cruz3.
[1] MUNDO ESPÍRITA - Agosto de 2023 - Número 1669 -
Ano 91 - http://www.mundoespirita.com.br/?materia=humildade-e-sabedoria
[2] XAVIER, Francisco Cândido. Pensamento e Vida – Cap.
INSTRUÇÃO. Pelo Espírito Emmanuel. Rio de Janeiro: FEB, 1991. cap. 4.
[3] Op. cit. cap. 24 – Humildade
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