sexta-feira, 11 de agosto de 2023

HUMILDADE E SABEDORIA[1]

 

Ludwig Knaus - "The Story Teller"


Telma Maria Santos Machado − agosto/2023

 

O meu curso primário, em uma escola pública estadual de Sergipe, foi marcado por livros de conteúdo lúdico: as várias histórias que pulavam das páginas mágicas eram um convite à imaginação de qualquer criança mais atenta às entrelinhas das mensagens, pois é fato que, muitas vezes, o que está subentendido é a moral da história. Em muitas delas viajei, ao lado da minha avó, sem sair do batente da nossa casa.

Uma dessas lições marcantes tinha dois personagens principais e toda a selva no papel de coadjuvante. Era um leão, que insistia em perguntar aos demais moradores da floresta quem era o rei da selva. Obviamente, que ele assim se julgava e, vaidoso, esnobava os demais animais, dizendo-se o mais ágil e veloz.

Mas havia um animal, não tão ágil, não tão veloz, nem tão arrogante. Tranquilo, como todo aquele que tem segurança íntima da própria força, o elefante. Com um movimento, ele deitou por terra toda a empáfia do felino: sem peripécias e sem cerimônia, pegou o Panthera leo pela cauda, fê-lo rodar várias vezes, arremessando-o a uma distância suficiente para vê-lo cair estatelado. Humilhação total para o animal de porte nobre que se achava o dono da selva.

A primeira lição de humildade eu aprendi com essa narrativa, nas páginas do livro cujo nome e autor não lembro. Pena que nem todos tenham acesso, ainda na meninice, a histórias assim, e mais penalizada fico dos que deixaram passar em branco a profunda lição que aí está retratada.

É que o ego tem mecanismos bem eficazes para fazer com que somente vejamos, ouçamos e assimilemos o que lhe convém. Por isso precisamos vigiá-lo, para não cairmos no ridículo que o supostamente poderoso leão caiu.

Mas, o que fazer para evitar quedas tão desastrosas? Ora, um rápido olhar para algumas palavras de filósofos e profetas, e teremos a profilaxia poderosa, o antídoto potente, a vacina eficaz: a humildade.

Sócrates, dentre todos os filósofos, através de uma frase, pontuou essa profilaxia para a Humanidade orgulhosa e frágil, melhor dizendo, frágil e orgulhosa, pois é fato que o orgulho provém de uma profunda fragilidade de mente, de alma e de espírito: Só sei que nada sei. Um marco na filosofia que remete a uma necessária autocrítica.

Alguns séculos depois, Jesus conclamou a Humanidade de todas as épocas, através das palavras e exemplos, ao sublime exercício da humildade.

No antigo Monte Eremos, hoje denominado Monte das Bem-Aventuranças, também conhecido como Monte das Beatitudes, o Mestre proclamou que todos aqueles que agirem com humildade de espírito (pobres de espírito) serão bem-aventurados. Por pobres de espírito deve-se entender aqueles que compreendem a necessidade de aprimorar o Espírito cada vez mais, cientes de que a ascensão requer conhecimento e amor, em outras palavras, sabedoria e bondade.

Pondera o Espírito Emmanuel[2]:

 Através do amor valorizamo-nos para a vida.

Através da sabedoria somos pela vida valorizados.

Daí o imperativo de marcharem juntas a inteligência e a bondade.

Bondade que ignora é assim como o poço amigo em plena sombra, a dessedentar o viajor sem ensinar-lhe o caminho.

 Inteligência que não ama pode ser comparada a valioso poste de aviso, que traça ao peregrino informes de rumo certo, deixando-o sucumbir ao tormento da sede.

Todos temos necessidade de instrução e de amor. Estudar e servir são rotas inevitáveis na obra de elevação.

Ainda Emmanuel assevera que[3]

A carência de humildade, que, no fundo, é reconhecimento de nossa pequenez diante do Universo, faz surgir na alma humana doentios enquistamentos de sentimento, quais sejam o orgulho e a cobiça, o egoísmo e a vaidade, que se responsabilizam pela discórdia e pela delinquência em todas as direções.

No fundo, estamos falando da prepotência do leão frente aos demais animais. A palavra prepotente deriva do latim praepotens, muito poderoso(a): de prae-, à frente, mais potens, poderoso, de potere, poder, portanto, aquele(a) que coloca o seu poder adiante, fazendo-o sobressair.

No caso do leão, falta-lhe, pela sua condição na escala evolutiva, a sabedoria, que a nós é facultada, de entender que a humildade, tal como assevera o Espírito Emmanuel, não se confunde com servidão, mas sim independência, liberdade interior, cuja nascente se encontra no âmago do Espírito, apoiando-lhe a permanente renovação para o bem, portanto, cultivá-la é avançar sem se prender, é projetar o melhor de si sobre os caminhos do mundo, não se podendo olvidar que, refletindo-a do Céu para a Terra, em penhor de redenção e beleza, o Cristo de Deus nasceu na palha da Manjedoura e despediu-se dos homens pelos braços da Cruz3.



[1] MUNDO ESPÍRITA - Agosto de 2023 - Número 1669 - Ano 91 - http://www.mundoespirita.com.br/?materia=humildade-e-sabedoria

[2] XAVIER, Francisco Cândido. Pensamento e Vida – Cap. INSTRUÇÃO. Pelo Espírito Emmanuel. Rio de Janeiro: FEB, 1991. cap. 4.

[3] Op. cit. cap. 24 – Humildade

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