terça-feira, 26 de abril de 2022

A JOVEM CAMPONESA DE MONIN - CASO DE APARIÇÃO[1]

 


Allan Kardec

 

Um dos nossos correspondentes de Oloron (Basses-Pyrénées), enviou-nos o relato do seguinte fato, que é de seu conhecimento pessoal:

 

Pelo fim do mês de dezembro de 1866, não longe do vilarejo de Monin (Basses-Pyrénées), uma camponesa de vinte e quatro anos, chamada Marianne Coubert, estava ocupada em juntar folhas num prado, perto da casa onde mora com seu pai, de sessenta e quatro anos, e uma irmã de vinte e nove. Desde alguns instantes, um velho de estatura média, vestido à camponesa, já se mantinha no canto do gradeado que dá passagem para o prado. De repente, ele chamou a jovem, que logo se aproxima, e pergunta se ela lhe podia dar uma esmola.

– Mas que vos poderia dar? perguntou ela. Nada tenho; a não ser que queirais aceitar um pedaço de pão.

– O que quiserdes, replicou o velho. Aliás, podeis ficar tranquila, ele não vos faltará.

E a camponesa apressou-se em ir buscar o pedaço de pão. Ao retornar, disse-lhe o velho:

– Há muito tempo que já me respondestes.

– Como, respondeu a camponesa atônita, eu vos podia responder? Ainda não me tínheis chamado.

– Eu não vos tinha chamado, é verdade, mas meu Espírito se havia transportado para vós, tinha penetrado o vosso Espírito e foi assim que conheci previamente as vossas intenções. Também parei diante de outra casa, lá embaixo; meu Espírito entrou e conheci as disposições pouco caridosas dos que ali habitam. Por isso pensei que seria inútil ali pedir alguma coisa. Se aquelas pessoas não mudarem, se continuarem a não praticar a caridade, muito terão a lamentar. Quanto a vós, jamais recuseis dar esmola, e Deus vos levará em conta os vossos sentimentos e vos dará muito além do que tiverdes dado aos infelizes... Estais doente dos olhos?

– Ah! sim, respondeu a camponesa, a maior parte das vezes minha vista é tão fraca que não posso me dedicar aos trabalhos do campo.

– Pois bem! continuou o velho, eis um par de óculos com os quais vereis perfeitamente. Tendes uma irmã que amastes muito e que morreu há oito anos e quatro meses.

– É verdade, respondeu a camponesa, cada vez mais atônita.

– Vossa mãe morreu há um ano.

– É verdade, continuou ela, ainda mais espantada.

– Pois bem! Ireis dizer cinco Pater e cinco Ave em seu túmulo. Aliás, ambas se encontram num lugar onde são felizes e onde as revereis um dia. Antes de vos deixar, tenho algo a vos recomendar: ide à casa de tal pessoa (uma moça de má conduta, que tinha vários filhos) e pedi-lhe que vos deixe levar um de seus filhos, que educareis até a época de sua primeira comunhão. Enfim, eis um missal que deveis guardar preciosamente, e ao qual está ligado uma graça para todos os que o tocarem. As pessoas que vos vierem ver deverão, ao chegar e ao partir, dizer dois Pater e duas Ave, pelas almas do purgatório. Entre essas pessoas, cujo número aumentará de dia para dia de modo considerável, há os que rirão, que zombarão; a estes não conteis nada. Não deixeis de recomendar à pessoa, na casa de quem deveis pegar o menino, que se converta, pois não creio que ela viva ainda muito tempo. Previno-vos que tereis uma grave moléstia pelo fim do mês de março; não mandeis chamar médico, pois será inútil; é uma prova a que vos deveis submeter com resignação. Aliás, eu voltarei a vos ver.

E o velho afastou-se. Chegando a uma pequena ponte muito próxima, desapareceu de repente.

Naturalmente, a jovem camponesa apressou-se em ir contar o fato ao Sr. Cura, ao qual mostrou o livro de orações. O Cura lhe disse que pensava que houvesse nisto algo de extraordinário e aconselhou-a a guardar o missal com cuidado. Ela se apressou em fazer tudo quanto o velho lhe havia recomendado, e depois a viram sempre com os óculos e o menino de que se havia encarregado. Foi visitada por uma multidão considerável e, no último domingo, sua casa estava tão cheia que o Cura teve que cantar as vésperas quase só. Não posso esquecer uma circunstância importante: é que, segundo a predição do velho, a camponesa estava acamada há oito dias. Agora é preciso dizer que em Monin, como em Oloron, as opiniões estão muito divididas a respeito do fato em questão. Uns acreditam, outros permanecem incrédulos. O Cura de Monin, que a princípio tinha achado a coisa muito extraordinária, pregou várias vezes para dissuadir seus paroquianos de ir visitar a camponesa. Segundo esta, a personagem que se apresentou a ela lhe disse seu nome e lhe confiou várias coisas que ela não devia revelar, pelo menos agora. Em tudo isto, o que me faria refletir um pouco, é que ele manifestou o desejo de que se erigisse uma estátua para o representar, no lugar onde apareceu.

A opinião geral, entre os crentes, é que deve ser São José. Para mim, se o fato for verdadeiro, aí não posso ver senão uma manifestação espírita, tendo por fim chamar a atenção sobre a nossa filosofia, numa região dominada por influências contrárias.



[1] Revista Espírita – Dezembro/1867 – Allan Kardec

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