terça-feira, 1 de dezembro de 2020

FILHOS, GUIAS ESPIRITUAIS DOS PAIS[1]

 


Allan Kardec

 

Tendo perdido um filho de sete anos, e tendo-se tornado médium, uma mãe teve por guia o próprio filho. Um dia ela lhe fez a seguinte pergunta:

 

Caro e bem-amado filho, um espírita, amigo meu, não compreende e nem admite que tu possas ser o guia espiritual de tua mãe, já que ela existia antes de ti e, indubitavelmente, deve ter tido um guia, nem que fosse durante o tempo em que tivemos a felicidade de ter-te ao nosso lado. Podes dar-nos algumas explicações?

Resposta do Espírito da criança – Como quereis aprofundar tudo quanto vos parece incompreensível? Mesmo aquele que vos parece mais adiantado no Espiritismo está apenas nos primeiros elementos desta doutrina e não sabe mais que este ou aquele, que vos parece a par de tudo e capaz de vos dar explicações.

– Eu existi muito tempo antes de minha mãe e, em outra existência, ocupei uma posição eminente por meus conhecimentos intelectuais.

Mas um imenso orgulho se havia apoderado de meu Espírito, e durante várias existências consecutivas fui submetido à mesma provação, sem dela poder triunfar, até chegar à existência em que estava junto de vós. Mas como já era adiantado e minha partida devia servir ao vosso progresso, a vós tão atrasados na vida espírita, Deus me chamou antes do fim de minha carreira, considerando minha missão junto a vós mais proveitosa como Espírito do que como encarnado.

Durante minha última estada na Terra, minha mãe teve o seu anjo-da-guarda junto a ela, mas temporariamente, porque Deus sabia que era eu que devia ser o seu guia espiritual e que eu a traria mais eficazmente na via de que ela estava tão afastada. Esse guia, que ela tinha então, foi chamado a uma outra missão, quando vim tomar seu lugar junto a ela.

Perguntai aos que sabeis mais adiantados do que vós, se esta explicação é lógica e boa, pois é possível que me engane ao expressar a minha opinião pessoal. Enfim, isto vos será explicado, se perguntardes. Muitas coisas que ainda vos são ocultas vos parecerão claras mais tarde. Não queirais aprofundar muito, porque dessa aparente preocupação nasce a confusão de vossas ideias.

Tende paciência; assim como um espelho embaciado por um sopro ligeiro pouco a pouco se clarifica, vosso espírito tranquilo e calmo atingirá esse grau de compreensão necessário ao vosso adiantamento.

Coragem, pois, bons pais; marchai com confiança, e um dia bendireis a hora da provação terrível que vos trouxe à via da felicidade eterna, e sem a qual ainda teríeis muitas existências infelizes a percorrer.

 

Observação – Essa criança era de uma precocidade intelectual rara para sua idade. Mesmo gozando saúde, parecia pressentir seu fim próximo; gostava dos cemitérios, e sem jamais ter ouvido falar do Espiritismo, em que seus pais não acreditavam, muitas vezes perguntava se, quando se está morto, não se podia voltar para os que se tinha amado; aspirava a morte como uma felicidade e dizia que quando morresse sua mãe não devia afligir-se, porque voltaria para junto dela. Com efeito, foi a morte de três filhos em alguns dias que levou os pais a buscar uma consolação no Espiritismo. Essa consolação eles a encontraram largamente e sua fé foi recompensada pela possibilidade de conversar a cada instante com os filhos, pois em muito pouco tempo a mãe tornou-se excelente médium, tendo até o próprio filho como guia, Espírito que se revela por grande superioridade.



[1] Revista Espírita – Agosto/1866 – Allan Kardec

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