David Eagleman - BBC Ideas - 14 dezembro 2019
Mais um ano chega ao fim...
Parece que foi ontem que estávamos comemorando a chegada de 2019. Passou
voando, não?
Mas nem sempre foi assim: na
infância, os meses que antecediam a chegada das férias escolares pareciam durar
anos.
A maneira como percebemos a
passagem do tempo sempre intrigou o neurocientista David Eagleman — é por isso
que ele se dedicou a estudar o surpreendente poder do nosso cérebro, conforme
relata abaixo, em primeira pessoa, à BBC Ideas:
Quando era criança, devia ter uns 8 anos, fui escalar uma casa que
estava em construção no bairro.
Cheguei muito perto da beirada do telhado e despenquei — a queda
pareceu demorar muito tempo.
Lembro de ver como o piso de tijolos vermelhos ia se aproximando. Uma
vez que toquei o chão, fiquei inconsciente... Mas também intrigado.
Desde então, me interessei pela maneira como percebemos o tempo.
Quando cresci e virei neurocientista, percebi que todos nós viemos ao
mundo com a ideia de que o tempo é como um rio que corre em uma única direção e
a uma velocidade constante.
Mas sabemos que isso pode ser diferente na sua cabeça e na minha,
porque, de alguma forma, o tempo é uma construção psicológica.
Em outras palavras, o cérebro está trancado no silêncio e na escuridão
da sua caixa craniana — e seu trabalho é descobrir o que está acontecendo lá
fora. Mas, para isso, precisa usar muitos truques de edição.
A visão e a audição emitem sinais em diferentes velocidades. No
entanto, quando você vê e escuta algo como um balão estourando ou alguém
batendo palmas, parece que a imagem e o som estão sincronizados.
Isso acontece porque o cérebro precisa compilar todas as informações
antes de montar uma história final e transmiti-la à sua percepção consciente.
É como se ele levasse um tempo para verificar se outros sinais estão
chegando, e isso significa que todos nós vivemos um pouco no passado.
O que acreditamos que está acontecendo agora ocorreu há pouco, provavelmente
cerca de meio segundo atrás.
Se você for ao meu laboratório, e eu te mostrar uma foto por meio
segundo no monitor e, na sequência, a mesma foto por meio segundo, e repetir
essa ação sucessivamente... quando, de repente, eu te mostrar uma imagem diferente
pelo mesmo período de tempo, vai parecer que a nova foto permaneceu por muito
mais tempo no monitor.
Isso acontece basicamente porque quando o cérebro vê uma coisa nova,
ele precisa usar mais energia para representá-la, uma vez que não era esperada.
Agora, a sensação de que as ações acontecem em câmera lenta é um truque
de memória.
Em outras palavras, quando você está em uma situação de emergência, uma
parte do cérebro chamada “amígdala” é ativada.
A amígdala é o seu centro de controle de emergência: armazena
recordações em um espaço de memória diferente da vida cotidiana.
Nesses casos, as lembranças são muito densas, porque você está em
alerta e toma nota de tudo o que está acontecendo ao seu redor.
E quando o cérebro lê as informações registradas durante o episódio, há
tanta informação que sua única conclusão é que o evento deve ter levado muito
tempo.
Curiosamente, isso também explica por que, à medida que envelhecemos,
parece que o tempo está passando mais rápido.
Quando você é criança, tudo é novidade. Você está descobrindo o mundo,
está acumulando muita memória e, portanto, quando faz uma retrospectiva no fim
de ano, tem muitas recordações do que aprendeu.
Mas quando você é mais velho e faz essa retrospectiva, provavelmente
passou muito tempo fazendo mais ou menos as mesmas coisas que vinha fazendo nos
anos anteriores. É por isso que parece que o ano voou.
Para sentir que você viveu mais, o que você precisa fazer é buscar
novidades.
Você pode começar com algo simples, como trocar o relógio de pulso ou
escovar os dentes com a outra mão.
Algo tão simples obriga a ativar seu cérebro, uma vez que ele não pode
prever exatamente o que vai acontecer, de forma que tem de participar.
Você verá que todas as noites, quando for dormir, vai ter muito mais
lembranças — e não vai mais parecer que a vida é um sopro.
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