A palavra Páscoa tem origem em dois vocábulos hebraicos: um, derivado do
verbo pasah, quer dizer “passar por
cima” (Êxodo, 23: 14-17), outro, traz raiz etimológica de pessach (ou pasha, do grego) indica apenas “passagem”. Trata-se de
uma festa religiosa tradicionalmente celebrada por judeus e por católicos das
igrejas romana e ortodoxa, cujo significado é distinto entre esses dois grupos
religiosos.
No judaísmo, a Páscoa comemora
dois gloriosos eventos históricos, ambos executados sob a firme liderança de
Moisés: no primeiro, os judeus são libertados da escravidão egípcia, assinalada
a partir da travessia no Mar Vermelho (Êxodo, 12, 13 e 14). O segundo evento
caracteriza a vida em liberdade do povo judeu, a formação da nação judaica e a
sua organização religiosa, culminada com o recebimento do Decálogo ou Os Dez
Mandamentos da Lei de Deus (Êxodo 20: 1 a 21). As festividades da Páscoa
judaica duram sete dias, sendo proibida a ingestão de alimentos e bebidas
fermentadas durante o período. Os pães
asmos (hag hammassôt), fabricados
sem fermento, e a carne de cordeiro são os alimentos básicos.
A Páscoa católica, festejada
pelas igrejas romana e ortodoxa, refere-se à ressurreição de Jesus, após a sua
morte na cruz (Mateus, 28: 1-20; Marcos, 16: 1-20; Lucas, 24: 1-53; João, 20:
1-31 e 21: 1-25). A data da comemoração da Páscoa cristã, instituída a partir
do século II da Era atual, foi motivo de muitos debates no passado. Assim, no
primeiro concílio eclesiástico católico, o Concílio Nicéia, realizado em 325
d.C., foi estabelecido que a Páscoa católica não poderia coincidir com a
judaica. A partir daí, a Igreja de Roma segue o calendário Juliano (instituído
por Júlio César), para evitar a coincidência da Páscoa com o Pessach.
Entretanto, as igrejas da Ásia Menor, permaneceram seguindo o calendário
gregoriano, de forma que a comemoração da Páscoa dos católicos ortodoxos
coincide, vez ou outra, com a judaica[2].
Os cristãos adeptos da igreja
reformada, em especial a luterana, não seguem os ritos dos católicos romanos e
ortodoxos, pois não fazem vinculações da Páscoa com a ressurreição do Cristo.
Adotam a orientação mais ampla de que há, com efeito, apenas uma ceia pascoal,
uma reunião familiar, instituída pelo próprio Jesus (Mateus 26:17-19; Marcos
14:12-16; Lucas 22:7-13) no dia da Páscoa judaica[3].
Assim, entendem que não há porque celebrar a Páscoa no dia da ressurreição do
Cristo. Por outro, fundamentados em
certas orientações do apóstolo Paulo (1Coríntios, 5:7), defendem a ideia de ser
o Cristo, ele mesmo, a própria Páscoa, associando a este pensamento importante
interpretação de outro ensinamento de Paulo de Tarso (1Corintios, 5:8): o
“cristão deve lançar fora o velho
fermento, da maldade e da malícia, e colocar no lugar dele os asmos da sinceridade e da verdade”3.
Algumas festividades politeístas relacionados à chegada da primavera e à
fertilidade passaram à posteridade e foram incorporados à simbologia da Páscoa.
Por exemplo, havia (e ainda há) entre países da Europa e Ásia Menor o hábito de
pintar ovos cozidos com cores diferentes e decorá-los com figuras abstratas,
substituídos, hoje, por ovos de chocolate. A figura do coelho da páscoa, tão comum no Ocidente, tem origem no culto à
deusa nórdica da fertilidade Gefjun,
representada por uma lebre (não coelho). As sacerdotisas de Gefjun eram capazes de prever o futuro,
observando as vísceras do animal sacrificado2.
É interessante observar que nos
países de língua germânica, no passado, havia uma palavra que denotava a festa
do equinócio do inverno. Subsequentemente, com a chegada do cristianismo, essa
mesma palavra passou a ser empregada para denotar o aniversário da ressurreição
de Cristo. Essa palavra, em inglês, “Easter”, parece ser reminiscência de
“Astarte”, a deusa-mãe da fertilidade, cujo culto era generalizado por todo o
mundo antigo oriental e ocidental, e que na Bíblia é chamada de Astarote. (…)
Já no grego e nas línguas neolatinas, “Páscoa” é nome que se deriva do termo
grego pascha3.
A Doutrina Espírita não comemora
a Páscoa, ainda que acate os preceitos do Evangelho de Jesus, o guia e modelo
que Deus nos concedeu: “(…) Jesus representa o tipo da perfeição moral que a
Humanidade pode aspirar na Terra[4]”.
Contudo, é importante destacar: o Espiritismo respeita a Páscoa comemorada
pelos judeus e cristãos, e compartilha o valor do simbolismo representado,
ainda que apresente outras interpretações.
A liberdade conquistada pelo povo judeu, ou a de qualquer outro povo no
Planeta, merece ser lembrada e celebrada. Os Dez Mandamentos, o clímax da
missão de Moisés, é um código ”(…) de todos os tempos e de todos os países, e
tem, por isso mesmo, caráter divino[5].
(…)”. A ressurreição do Cristo representa a vitória sobre a morte do corpo
físico, e anuncia, sem sombra de dúvidas, a imortalidade e a sobrevivência do
Espírito em outra dimensão da vida.
Os discípulos do Senhor
conheciam a importância da certeza na sobrevivência para o triunfo da vida
moral. Eles mesmos se viram radicalmente transformados, após a ressurreição do
Amigo Celeste, ao reconhecerem que o amor e a justiça regem o ser além do
túmulo. Por isso mesmo, atraiam companheiros novos, transmitindo-lhes a
convicção de que o Mestre prosseguia vivo e operoso, para lá do sepulcro[6].
Os espíritas, procuramos
comemorar a Páscoa todos os dias da existência, a se traduzir no esforço perene
de vivenciar a mensagem de Jesus, estando cientes que, um dia, poderemos também
testemunhar esta certeza do inesquecível apóstolo dos gentios: “Fui crucificado junto com Cristo. Já não
sou eu quem vivo, mas é Cristo vive em mim. Minha vida presente na carne,
vivo-a no corpo, vivo-a pela fé no Filho de Deus, que me amou e se entregou a
si mesmo por mim”. (Gálatas 2.20)[7]
[6]
Referências
BÍBLIA DE JERUSALÉM. Diversos
tradutores. São Paulo: Paulus, 2002.
ELWELL, Walter A (editor).
Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã. Trad. Gordon Chow. 1ªed. 3ª
reimp. Vol. III. São Paulo: Edições Vida
Nova, 2003.
DOUGLAS, J.D. (organizador).
O Novo Dicionário da Bíblia. Tradução de
João Bentes. 3ª ed. rev. São Paulo: Vida Nova, 2006.
KARDEC, Allan. O Livro dos
Espíritos. Trad. Evandro Noleto Bezerra. 2ªed. 1ª reimp. Rio de Janeiro: FEB
Editora, 2011.
_____. O Evangelho segundo o
Espiritismo. Trad. Evandro Noleto Bezerra. 1ªed. 1ª reimp. Rio de Janeiro: FEB
Editora, 2008.
XAVIER, Francisco Cândido.
Pão Nosso. Pelo Espírito Emmanuel. 1ªed. 3ª reimp. Brasília: FEB Editora, 2012
(Coleção Fonte viva;2)
[5] Idem. O Evangelho segundo o Espiritismo. Cap. I, it. 2,
pág. 56.
[6] Francisco Cândido Xavier. Pão Nosso. Pelo Espírito
Emmanuel. Cap. 176, pág. 365.
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