sexta-feira, 27 de outubro de 2017

Sofrimento[1]


 Cairbar Schutel


Sofrimento é, em tese, um estado de espírito desequilibrado que envolve o encarnado em determinadas fases de sua jornada, resultante da inadaptação ou rebeldia diante dos obstáculos de quaisquer espécies que lhe surjam à frente.
Os obstáculos são as provas ou as expiações pelas quais todo ser humano deve passar, pois fatores necessários ao progresso do ser.
O sofrimento pode gerar inúmeros sentimentos e estados de espírito secundários negativos.
Não há frutos positivos da rebeldia diante do sofrimento.
Em verdade, termina por significar inaceitabilidade do homem aos Desígnios Divinos, pois nada acontece por acaso e tudo que envolve o encarnado, numa visão positiva ou negativa, tem uma razão plenamente justificada e absolutamente justa, pois Deus não falha.
Revoltar-se é um ato de irresignação, porque o indivíduo recusa-se a seguir, como todos devem fazer, as Leis Divinas, que determinam não haver progresso sem luta e perseverança. Consequentemente, não há evolução sem o vencimento de provas e a ultrapassagem resignada das expiações.
Pode tratar-se de um estado de espírito desequilibrado, fruto da inconstância e do desajuste — condições suficientes para determinar o surgimento de outros males de variada ordem. A título de exemplo, o sofrimento, nesse caso, pode trazer angústia, tristeza, amargura, dores físicas e psíquicas, emotividade exacerbada, sensibilidade extrema, ira e, sobretudo, ódio.
O sofrimento moral é capaz, nessas circunstâncias, de gerar doenças no corpo físico porque provoca desajustes no sistema imunológico, em grande parte controlado pelo psíquico, que é dirigido pelo espírito.
Pode causar também doenças mentais e psicológicas, visto abalar o sistema nervoso.
Sofrer por sofrer não traz vantagem alguma, somente problemas.
Deixar de revoltar-se diante do inevitável é mostra de evolução, pois representa aceitação plena da Vontade de Deus.
No campo da reforma íntima, o mais indicado para amenizar e afastar o sofrimento é compreender a lei da reencarnação, acatando-a como justa e verdadeira.
Sabendo que, para ser autêntica e definitivamente feliz, o Espírito deve passar por vários estágios, vale dizer, por inúmeras reencarnações e que cada uma delas lhe proporciona oportunidade ímpar de progresso espiritual, o encarnado pode, aos poucos, em primeiro lugar, tranquilizar o seu âmago, aceitando as provas que lhe surgem à frente.
Outro passo fundamental para extirpar ou diminuir o sofrimento é a pessoa aprender a manipular positivamente os próprios sentimentos, racionalizando-os e impedindo que as emoções dominem a sua razão.
O terceiro estágio é praticar a via inversa dos sentimentos negativos, que são frutos do sofrimento ou seus geradores, exercitando os positivos, derivados do amor. Quanto mais o encarnado consegue colocá-los em ação, menos sofre.
Atitudes de reclamação passiva merecem ser evitadas. Ao invés de questionar a falta de determinado bem, por que não lutar para obtê-lo? É preferível sair em busca da felicidade do que se queixar de que é infeliz.
Por mais simples que possa parecer, muitos ainda não meditaram suficientemente no que lhes significa viver em função de situações e acontecimentos do passado. O melhor a fazer, especialmente no que tange aos fatos que consideram negativos da vida, é deixá-los no pretérito, tal como a lei universal da evolução determina ao impulsionar o ser humano para o futuro.
Viver consciente e determinado no presente, bem como esperançoso no tocante ao futuro, supera as possíveis raízes negativas do passado e coloca o encarnado longe do desespero.
Lembrar que o eventual sofrimento de hoje, amanhã será passado e, portanto, facilmente superável.
Não projetar o sofrimento presente para o futuro (como se fosse um mal eterno, que inexiste) afasta a possibilidade de prejudicar a esperança.
Usar as linhas do passado como lição e aprendizado dos erros cometidos, para evitá-los no presente e no futuro, é sabedoria, mas servir-se delas para trazer desacertos representa imaturidade.
Uma das razões invocadas pelo homem para justificar seu sofrimento é a falta ou insuficiência de bens materiais. É preciso notar que muito desse sofrimento em realidade é originário do materialismo, outro mal que assola o plano físico.
A perda de entes queridos, entendendo-se como tal o regresso desses seres à pátria espiritual, é motivo de sofrimento para muitos. Ainda que seja compreensível tal situação diante do atual estágio evolutivo da humanidade, torna-se necessário frisar que a volta ao mundo da verdadeira vida é motivo de alegria, de trajetória cumprida e, portanto, de etapa vencida. Permanecer no plano material é fase de provas e sede de obstáculos e lutas. Retornar pelos caminhos normais é sinal de finalização de uma jornada e, portanto, mostra de esperança num futuro melhor.
Por pior que seja a passagem do Espírito pela vida material, inexiste o retrocesso na escala evolutiva, pois o progresso o aguarda.
Fonte de sofrimento é a autopunição: aquele que, para condenar um gesto próprio, impõe-se o desequilíbrio espiritual, cultiva sentimentos negativos. Ainda que alguns entendam que ele é abnegado sofredor e, portanto, mártir do próprio rigorismo, não há mérito em usurpar uma função que é exclusiva de Deus. Do mesmo modo que não lhe cabe julgar o próximo, inexiste, como valor cristão, a autoanalise como forma de infligir um castigo a si mesmo. Autocrítica deve ser usada para o lado positivo, com a melhora dos sentimentos, jamais para a aplicação de uma pretensa pena, em verdade fator de sofrimento ao espírito.
Por isso é censurável o suicídio. Não cabe ao homem eliminar a própria vida. Não é atribuição do encarnado julgar-se e, com isso, aplicar a si mesmo uma pena mortal, por pior que tenha sido alguma conduta sua.
Por outro, se o suicídio é praticado não como forma de autopunição, mas para evitar sofrimento, é outro malogro que o ser humano comete. Por dois fatores essenciais: primeiro, porque o sofrimento é somente uma incompreensão da realidade, logo, superável e, segundo, porque, extinta a vida material, continuará a espiritual, aumentando-lhe a expiação e, consequentemente, o sofrimento.
Ninguém se afasta do sofrimento pela fuga da realidade, mas fundamentalmente pelo esclarecimento alcançado através da fé raciocinada, ladeada pela racionalização dos sentimentos.



[1] Fundamentos da Reforma Íntima – Cairbar Schutel / Abel Glaser

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