quarta-feira, 22 de março de 2017

DAS PARTÍCULAS REBELDES AO BÓSON DE HIGGS[1]



Elton Rodrigues - 14/03/2017

 “As palavras pouco importam; cabe a vós formular vossa linguagem de maneira a vos entenderdes. Vossas discussões provêm, quase sempre, de não vos entenderdes sobre as palavras, porque vossa linguagem é incompleta para as coisas que não impressionam os vossos sentidos.”

O Livro dos Espíritos, questão 28

 
Desde tempos primevos[2], o homem procura entender o espaço que habita e os fenômenos que o circundam. Assim, procura alcançar o conhecimento total sobre todas as coisas. Após ter visto um momento de esplendor na Grécia Antiga, tendo como nome principal Aristóteles, a Física entrou em declínio na Idade Média, tendo revivido apenas durante o Renascimento, durante a Revolução Científica. Galileu Galilei é considerado o primeiro Físico em seu sentido moderno, adotando a Matemática como ferramenta principal. É, também, um dos pioneiros a descrever o real objetivo de um cientista: sua função é apenas descrever os fenômenos em vez de tentar explicá-los.
Já dotada de um método científico, a Física teve uma notável evolução com Isaac Newton, que realizou a primeira grande unificação ao consorciar Céus e Terra sob as mesmas leis da Física: a Gravitação Universal. Nos séculos XVIII e XIX surgiram os fundamentos da termodinâmica e do eletromagnetismo, destacando-se Clausius, Joule e Michael Faraday. James Clerk Maxwell realizou outra grande unificação da Física ao fundir eletricidade e magnetismo sob as mesmas descrições matemáticas, sendo que toda a óptica pode ser derivada da teoria eletromagnética de Maxwell. No final do século XIX, pensava-se que todos os fenômenos físicos poderiam ser explicados dentro das teorias correntes. Entretanto, certos “fenômenos rebeldes” fugiam ao alcance dos cientistas.
No início do século XX, ao tentar explicar matematicamente a radiação de corpo negro (radiação eletromagnética emitida por qualquer corpo em determinada temperatura), Max Planck introduziu o conceito de quantum de energia. Em 1905, Albert Einstein apresentou, sob a forma de cinco artigos, as bases da Relatividade e da Mecânica Quântica. Tais “fenômenos rebeldes” finalmente foram explicados, mas a ontologia determinista estrita e pontual, característica da mecânica newtoniana, foi abalada seriamente; sendo, ainda, fortemente ferida após a publicação do Princípio da Incerteza de Werner Heisenberg e do princípio da complementaridade (assevera que a natureza da matéria e energia é dual e os aspectos ondulatório e corpuscular não são contraditórios, mas complementares) de Niels Bohr. Desde então, a Física preocupa-se em explicar, sob o ponto de vista da Física moderna, a natureza das quatro forças fundamentais da Natureza (gravidade, forte, fraca e eletromagnética. O problema é que há uma mistura de adjetivos com substantivos) e eletromagnetismo. O Modelo Padrão, apresentado na década de 70, descreve três das quatro forças (a gravidade ainda carece de uma explicação teórico-experimental). Mas faltava a realização de um experimento para que essa tese — a unificação destas forças — fosse confirmada e, assim, aceita pela comunidade científica. Era preciso encontrar uma partícula chamada bóson de Higgs, batizada em homenagem ao físico escocês Peter Higgs, que a previu em 1964.
O que são bósons? De acordo com a física moderna, tudo que existe pode ser descrito por meio de 17 partículas elementares. Elas são divididas em dois grupos: os férmions e os bósons. Os férmions são subdivididos em seis tipos de quarks (que constituem o próton e o nêutron do núcleo atômico) e seis de léptons (entre eles, o elétron). Os bósons incluem outros cinco tipos de partículas, como o fóton (partícula de luz) e a de Higgs. O bóson de Higgs é importante porque explica como o átomo adquire massa e, assim, compõe toda a matéria. Logo após o Big Bang, a explosão que deu origem ao Universo há 13,7 bilhões de anos, um campo formado por partículas de Higgs foi responsável pela desaceleração e resfriamento de outras partículas elementares. Isso possibilitou a formação de estrelas, planetas e tudo o mais que existe no Universo. A experiência que permitiria aos cientistas observar o “bóson da Criação” só poderia ser realizada no LHC[3], pertencente ao Cern (Organização Europeia para a Pesquisa Nuclear).
O acelerador foi construído na fronteira entre a França e a Suíça, em 2008, ao custo de 10 bilhões de dólares. É o maior e mais caro instrumento científico já construído pelo Homem. Depois de quase meio século, físicos anunciaram no dia 4 de julho de 2012 a descoberta do bóson de Higgs, a peça que faltava para compor o “quebra-cabeça” que representa toda a matéria do Universo. Essa descoberta, agora, poderá abrir novos caminhos e dar esperanças para a formulação da Teoria do Campo Unificado, que irá reunir a física de partículas do Modelo Padrão com a teoria da gravidade, entender mistérios como a energia escura e — por que não dizer? — estar mais próximos do fluido cósmico universal.




[2] Relativo aos primeiros tempos; antigo, primitivo.
[3] Large Hadron Collider - Grande Colisor de Hádrons

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