terça-feira, 19 de abril de 2016

Foi uma fatalidade...[1]



Antônio Carlos Navarro [2]
 
A expressão que dá título a este ensaio é muito utilizada no cotidiano, para justificar acontecimentos que não temos explicações plausíveis.
Deixa a impressão de que foi a vontade de Deus, e que não temos alternativa senão a de nos acomodarmos aos Seus desígnios, vivendo como marionetes, sem termos participação ativa nos acontecimentos da vida.
A vida tem um propósito, que é o de dar ao espírito condições de atingir a perfeição, conforme nos esclarece o Consolador Prometido por Nosso Senhor Jesus Cristo [3]:
“Qual é o objetivo da encarnação dos Espíritos? – A Lei de Deus lhes impõe a encarnação com o objetivo de fazê-los chegar à perfeição. Para uns é uma expiação; para outros é uma missão. Mas, para chegar a essa perfeição, devem sofrer todas as tribulações da existência corporal: é a expiação. A encarnação tem também um outro objetivo: dar ao Espírito condições de cumprir sua parte na obra da criação…” [4]
Para o ser consciente de suas condições e possibilidades de progresso, condicionado ao merecimento, a participação no planejamento de sua futura existência física é, segundo os Benfeitores Espirituais, condição comum às criaturas:
“Na espiritualidade, antes de começar uma nova existência corporal, o Espírito tem consciência e previsão das coisas que acontecerão durante sua vida? – Ele mesmo escolhe o gênero de provas que quer passar. Nisso consiste seu livre-arbítrio.” [5]
Porém, para que não restassem dúvidas a respeito, ao estudar a Lei de Liberdade, Allan Kardec, o eminente codificador da Doutrina Espírita, questionou:
“Haverá fatalidade nos acontecimentos da vida, conforme o sentido que se dá a essa palavra, ou seja, todos os acontecimentos são predeterminados? Nesse caso, como fica o livre-arbítrio? – A fatalidade existe apenas na escolha que o Espírito fez ao encarnar e suportar esta ou aquela prova. E da escolha resulta uma espécie de destino, que é a própria consequência da posição que ele próprio escolheu e em que se acha. Falo das provas de natureza física, porque, quanto às de natureza moral e às tentações, o Espírito, ao conservar seu livre-arbítrio quanto ao bem e ao mal, é sempre senhor para ceder ou resistir. Um bom Espírito, ao vê-lo fraquejar, pode vir em sua ajuda, mas não pode influir de modo a dominar sua vontade. Um Espírito mau, ao lhe mostrar de forma exagerada um perigo físico, pode abalá-lo e assustá-lo. Porém, a vontade do Espírito encarnado está constantemente livre para decidir.” 5
O esquecimento do que foi proposto pelo próprio espírito é justificado:
“A cada nova existência o homem tem mais inteligência e pode melhor distinguir o bem do mal. Onde estaria o mérito, ao se lembrar de todo o passado? Quando o Espírito volta à sua vida primitiva (a vida espírita), toda sua vida passada se desenrola diante dele; vê as faltas que cometeu e que são a causa de seu sofrimento e o que poderia impedi-lo de cometê-las. Compreende que a posição que lhe foi dada foi justa e procura então uma nova existência em que poderia reparar aquela que acabou. Escolhe provas parecidas com as que passou ou as lutas que acredita serem úteis para o seu adiantamento, e pede a Espíritos Superiores para ajudá-lo nessa nova tarefa que empreende, porque sabe que o Espírito que lhe será dado por guia nessa nova existência procurará fazê-lo reparar suas faltas, dando-lhe uma espécie de intuição das que cometeu.” [6]
Não podemos negligenciar o uso da inteligência para entendimento racional das circunstâncias. As prevenções, cuidados e planejamentos são atribuições nossas na vida física, e se nos deixarmos levar pela precipitação e ansiedade estaremos expostos a acontecimentos decorrentes que nem sempre teríamos necessidades de vivenciar.
O Benfeitor Espiritual André Luiz nos esclarece:
“Incorporando a responsabilidade, a consciência vibra desperta e, pela consciência desperta, os princípios de ação e reação funcionam, exatos, dentro do próprio ser, assegurando-se a liberdade de escolha e impondo-lhe, mecanicamente os resultados respectivos, tanto na esfera física quanto no Mundo Espiritual [7].
Alguns acontecimentos que estão previstos são inevitáveis em função de necessidades espirituais maiores, outros poderão ser evitados com o simples uso da reflexão, do bom senso e da oração, conforme asseverou o Senhor Jesus, e sempre será infrutífero buscar identificar uma e outra coisa na tentativa de melhor proveito das situações. O melhor é vivermos confiantes na justiça divina, fazendo a nossa parte, porque, na Sua perfeição, Deus está fazendo a Dele, afinal de contas “não cai uma folha de árvore sem que Ele o saiba”.
 
Pensemos nisso.


[2] Antônio Carlos Navarro é membro da Rede Amigo Espírita, estudioso e palestrante espírita. Trabalhador do Centro Espírita Francisco Cândido Xavier em São José do Rio Preto – SP - e-mail: antoniocarlosnavarro@gmail.com
[3] João 14:26
[4] O Livro dos Espíritos, questão 132
[5] Idem, questão 258
[6] O Livro dos Espíritos, questão 393
[7] Evolução em Dois Mundos, cap. 11 – Existência da alma

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