Chegamos agora a uma ordem de manifestações que se produzem à distância sem o concurso dos órgãos, tanto na vigília quanto no sono. Esses fenômenos, conhecidos pelo termo um tanto genérico e vago de telepatia, não são, dissemos, atos doentios e mórbidos da personalidade, como certos observadores o têm acreditado, mas, pelo contrário, casos parciais, rebentos isolados da vida superior no seio da humanidade. Deve-se ver neles o primeiro aparecimento dos poderes futuros com que o homem terrestre será dotado. O exame desses fatos levar-nos-á a reconhecer que o “eu” exteriorizado durante a vida e o “eu” que sobrevive após a morte são idênticos e representam dois aspectos sucessivos da existência de um único e mesmo ser.
A telepatia, ou projeção à
distância do pensamento e mesmo da imagem do manifestante, faz-nos subir mais
um degrau na escala da vida psíquica. Aqui, achamo-nos na presença de um ato
poderoso da vontade. A alma comunica-se a si própria, comunicando a sua
vibração, o que demonstra à evidência que a alma não é um composto, uma
resultante nem um agregado de forças, mas sim, pelo contrário, o centro da vida
e da vontade, centro dinâmico que governa o organismo e dirige-lhe as funções.
As manifestações telepáticas não comportam limites. O poder e a independência
da alma nelas se revelam soberanamente, porque o corpo nenhum papel representa
no fenômeno. É mais um obstáculo do que um auxílio. Produzem-se, por esse
motivo, ainda com maior intensidade, depois da morte, como a seu tempo veremos.
“A auto projeção, diz Myers, é o
único ato definido que o homem parece capaz de executar, tanto antes como
depois da morte corporal.”
A comunicação telepática a
distância foi estabelecida por experiências que se tornaram clássicas. Podemos
citar as do Sr. Pierre Janet, hoje professor da Sorbonne, e do Dr. Gilbert, do
Havre, no seu sujet Léonie que eles,
de noite, a um quilômetro de distância, fazem vir ao seu encontro por meio de
chamamentos sugestivos.
Desde então as experiências se
foram multiplicando com êxito constante. Apontemos apenas vários casos de
transmissão de pensamento a grande distância:
Os Annales des Sciences Psychiques, Paris, 1891, pág. 26, relatam uma
experiência de transmissão mental de imagem, feita a 171 quilômetros de
distância, de Paris a Ribemont (Aisne). Os operadores eram os Senhores Debaux e
Léon Hennique.
O Daily Express, de 17 de julho de 1903, refere notáveis ensaios de
permuta de pensamentos, que se efetuaram nos escritórios da Review of Reviews, em Norfolk Street,
Strand, Londres. Essas experiências eram fiscalizadas por uma comissão de seis
membros, da qual faziam parte o Dr. Wallace, de Harley Street, 39, e o eminente
publicista W. Stead. As mensagens telepáticas foram enviadas pelo Sr.
Richardson, de Londres, e recebidas pelo Sr. Franck, de Nottingham, a uma
distância de 110 milhas inglesas.
Finalmente, o Banner of Light, de Boston, no seu
número de 12 de agosto de 1905, informa-nos que uma americana, a Sra. Burton
Johnson, de Des Moines, conquistou recentemente o recorde nesse gênero de
transmissão. Sentada no seu quarto do Hotel Vitória, recebeu quatro vezes
mensagens telepáticas de Palo Alto (Califórnia), que fica a distância de três
mil milhas. Trata-se, diz o jornal, de fatos devidamente comprovados,
rigorosamente fiscalizados e que não deixam subsistir dúvida alguma.
A transmissão dos pensamentos e
das imagens opera-se, dissemos, indistintamente, tanto durante o sono, como no
estado de vigília. Já expusemos vários casos; serão encontrados outros, em
grande número, nas obras especiais. Mencionemos, por exemplo, o de um médico
chamado telepaticamente durante a noite e o de Agnés Paquet, citados por Myers.
Acrescentemos o caso da Sra. Elgee, que, estando no Cairo, teve a visão de um amigo
que, naquele mesmo momento, em Inglaterra, pensava nela ardentemente.
Nos últimos dias da sua vida,
minha mãe via-me muitas vezes junto de si, em Tours, conquanto eu andasse então
muito longe dali, em viagem pelo oriente da França.
Todos esses fenômenos podem ser
explicados pela projeção da vontade do manifestante, que evoca no percipiente a
própria imagem do agente.
Nos casos a seguir, veremos a
personalidade psíquica, a alma, destacar-se completamente do invólucro corpóreo
e aparecer na sua forma de fantasma. A esse respeito são inúmeros os
testemunhos.
Relatamos em outra obra os
resultados dos inquéritos da Sociedade de Pesquisas Psíquicas, de Londres.
Permitiram eles que se recolhessem cerca de mil casos de aparições, à
distância, de pessoas vivas, apoiados por atestados de alto valor. Os
testemunhos foram consignados em muitos volumes, sob a forma de autos.
Foram assinados por homens de
ciência pertencentes a academias ou diversos corpos científicos. Entre esses
nomes figuram os de Gladstone, Balfour etc.
Atribui-se, geralmente, a esses
fenômenos, caráter subjetivo; mas essa opinião não resiste a um exame atento.
Certas aparições foram vistas sucessivamente, por várias pessoas, nos
diferentes andares de uma casa; outras impressionaram animais, como cães,
cavalos, etc. Em certos casos, os fantasmas atuam sobre a matéria, abrem
portas, deslocam objetos, deixam indícios no pó que cobre os móveis; ouvem-se
vozes, que dão informações a respeito de fatos ignorados, sendo mais tarde
essas informações reconhecidas como exatas.
No número desses casos devemos
incluir o da Senhora Hawkins, cujo fantasma foi visto simultaneamente por
quatro pessoas e do mesmo modo; as visões de Mac-Alpine, de Carrol, Stevenson;
a de um marinheiro que, estando a velar junto de um camarada moribundo, viu
aparecer uma família inteira de fantasmas, trajando luto; o caso de Clerk em
que o irmão moribundo apareceu a uma negra que nunca o conhecera.
Na França, foram recolhidos
numerosos fatos da mesma natureza e publicados pelos Annales des Sciences Psychiques, do Dr. Dariex e do Prof. Charles
Richet e por Camille Flammarion, na sua obra O Desconhecido e os Problemas Psíquicos.
Vamos citar um caso
recentíssimo. Os grandes jornais de Londres, o Daily Express, o Evening News,
o Daily News, de 17 de maio de 1905,
o The Umpire, de 14 de maio, etc.,
narram a aparição, em plena sessão do Parlamento, na Câmara dos Comuns, do
fantasma de um deputado, o Major Sir Carne Raschse, retido nesse momento em
casa por causa de uma indisposição. Três outros deputados atestam a realidade
da manifestação. Sir Gilbert Parker exprime-se da seguinte maneira:
Eu
queria tomar parte no debate, mas se esqueceram de chamar-me. Quando voltava
para o meu lugar, dei com os olhos em Sir Carne Raschse sentado perto do seu
lugar do costume. Como sabia que ele tinha estado doente, fiz-lhe um gesto
amigável, dizendo-lhe: “Estimo que esteja melhor”; mas ele não deu resposta
alguma, o que me causou admiração. A fisionomia do meu amigo estava muito
pálida. Ele estava sentado, quieto, com a fronte encostada à mão; a expressão
do seu rosto era impassível e dura. Pensei um instante no que havia de fazer.
Quando me voltei para Sir Carne, havia ele desaparecido. Imediatamente fui à
sua procura, esperando encontrá-lo no vestíbulo; mas Raschse não estava lá;
ninguém aí o vira... O próprio Sir Carne não duvidava de ter realmente
aparecido na Câmara sob a forma do seu duplo, por causa da preocupação em que
estava de dar ao Governo o apoio do seu voto.
No Daily News de 17 de maio de 1905, Sir Arthur Hayter junta o seu testemunho ao de Sir Gilbert Parker. Diz que ele também não só viu Sir Carne
Raschse, como chamou a atenção de Sir
Henry Campbell Bannerman para a sua presença na Câmara.
A exteriorização, ou
desdobramento, do ser humano pode ser provocada pela ação magnética. Fizeram-se
experiências que tornam impossível a dúvida. O paciente, adormecido,
desdobra-se e vai produzir, à distância, atos materiais.
Citamos o caso do magnetizador
Lewis. Em outras circunstâncias semelhantes foi a aparição fotografada.
Aksakof, na sua obra Animismo e
Espiritismo, cita três desses casos; outros fatos análogos foram observados
pelo Capitão Volpi e por W. Stead, diretor do Borderland.
No caso Istrati e Hasdeu – este
último senador da Romênia – a forma desdobrada do professor Istrati
impressionou placas fotográficas, à noite, a distância de 50 quilômetros do
lugar onde estava o seu corpo adormecido.
Assim, a objetividade da alma,
com a sua forma fluídica manifestando-se em pontos afastados daquele onde o
corpo se acha em descanso, está demonstrada de maneira positiva e não pode ser
contestada seriamente.
Ademais, basta consultar a
História para reconhecer-se que o passado está cheio de fatos desse gênero. Os
fenômenos de bilocação dos vivos são frequentes
nos anais religiosos. O passado não é menos rico em narrações e testemunhos a
respeito dos Espíritos dos mortos e essa abundância de afirmações, essa
persistência através dos séculos são bem próprias para indicar que, no meio das
superstições e dos erros, alguma coisa de realidade deve existir.
Com efeito, a comunicação e a
manifestação a distância entre Espíritos encarnados conduzem, lógica e
necessariamente, à comunicação possível entre Espíritos encarnados e
desencarnados. A esse respeito, assim se expressa Myers: “Nós podemos
impressionar-nos reciprocamente à distância e, se os nossos Espíritos
encarnados podem assim atuar, de maneira independente do organismo carnal, há
nisto uma presunção favorável à existência de outros Espíritos independentes
dos corpos e suscetíveis de nos impressionarem do mesmo modo.”
Os habitantes do espaço têm
facultado muitas provas experimentais da lei da comunhão universal na medida
fraca e estreita em que na Terra ela pode ser verificada com rigor.
Devemos apontar, entre outros
fatos, a experiência da Sociedade de Pesquisas de Londres, à qual o mundo sábio
é devedor de tantas descobertas no domínio psíquico. Estabeleceu ela um sistema
de permutas de pensamentos entre os Estados Unidos e a Inglaterra, simplesmente
com o auxílio de dois médiuns em transe, que serviram para transmitir uma
mensagem de um Espírito a outro Espírito.
A mensagem consistia em quatro palavras latinas e o latim era língua que os
médiuns não conheciam.
Essa experiência foi feita sob a
vigilância e a fiscalização do Prof. Hyslop, da Universidade de Colúmbia, em
Nova Iorque, e tomaram-se todas as precauções necessárias para serem evitadas
as fraudes.
Quando se estuda, nos seus
diversos aspectos, o fenômeno da telepatia, as vistas gerais que daí resultam
aumentam pouco a pouco e somos levados a reconhecer nele um processo de
comunicação de alcance incalculável. A princípio, esse fenômeno nos foi
apresentado como uma simples transmissão, quase mecânica, de pensamentos e
imagens entre dois cérebros; mas o fenômeno vai revestir as formas mais
variadas e impressionantes. Depois dos pensamentos vêm as projeções, a
distância, dos fantasmas dos vivos, as dos moribundos e, finalmente, sem que
nenhuma solução de continuidade interrompa o encadeamento dos fatos, as
aparições dos mortos, quando o vidente, na maior parte dos casos, nenhum
conhecimento tem do falecimento das pessoas que aparecem. Há aí uma série
contínua de manifestações, que se vão graduando nos seus efeitos e concorrem
para demonstrar a indestrutibilidade da alma.
A ação telepática não conhece
limites; suprime todos os obstáculos e liga os vivos da Terra aos vivos do
espaço, o mundo visível aos mundos invisíveis, o homem a Deus; une-os da
maneira mais estreita, mais íntima.
Os meios de transmissão que ela
nos revela constituem a base das relações sociais entre os Espíritos, o seu
modo usual de permutarem as ideias e as sensações. O fenômeno que na Terra se
chama telepatia não é outra coisa senão o processo de comunicação entre todos
os seres pensantes na vida superior e a oração é uma das suas formas mais
poderosas, uma das suas aplicações mais elevadas e mais puras. A telepatia é a
manifestação de uma lei universal e eterna.
Todos os seres, todos os corpos
permutam vibrações. Os astros exercem influência através das imensidades
siderais; do mesmo modo, as almas, que são sistemas de forças e focos de
pensamentos, impressionam-se reciprocamente e podem comunicar-se a todas as
distâncias. A atração estende-se às almas como aos astros; atrai-os para um
Centro comum, eterno e divino. Uma dupla relação se estabelece. Suas aspirações
sobem para ele na forma de apelos e orações. E, sob a forma de graças e
inspirações, descem os socorros.
Os grandes poetas, escritores,
artistas, os sábios e os puros conhecem esses impulsos, essas inspirações
súbitas, esses clarões de gênio que iluminam o cérebro como relâmpago e parecem
provir de um mundo superior, cuja grandeza e inebriante beleza refletem, ou
então são visões da alma. Num arrojo extático ela vê entreabrir-se esse mundo
inacessível, percebe-lhe as radiações, as essências, as luzes.
Tudo isso demonstra-nos que a
alma é suscetível de ser impressionada por meios diferentes dos órgãos, que ela
pode recolher conhecimentos que excedem as faculdades humanas e provêm de uma
causa espiritual. Graças a esses clarões, a esses relâmpagos, ela entrevê, na
vibração universal, o passado e o futuro; percebe a gênese das formas, formas
de arte e pensamento, de beleza e santidade, da qual perenemente derivam formas
novas, numa variedade inesgotável como o manancial de onde emanam.
Consideremos essas coisas sob um
ponto de vista mais direto; vejamos as suas consequências no meio terrestre. Já
pelos fatos telepáticos se acentua a evolução humana. O homem conquista novos
poderes psíquicos que lhe permitirão, um dia, manifestar o seu pensamento a
todas as distâncias, sem intermediário material. Esse progresso constitui um
dos mais magníficos estádios da humanidade para uma vida mais intensa e livre. Poderá
ser o prelúdio da maior revolução moral que se tenha realizado em nosso Globo.
Por esse modo seria realmente vencido, ou consideravelmente atenuado, o mal.
Quando o homem já não tiver
segredos, quando se lhe puder ler no cérebro os pensamentos, ele não mais se
atreverá a pensar no mal e, por conseguinte, a fazer o mal. Assim, a alma
humana elevar-se-á sempre, subindo pela escala dos desenvolvimentos infinitos.
Tempos virão em que a inteligência há de predominar cada vez mais,
desembaraçando-se da crisálida carnal, estendendo, afirmando o seu domínio
sobre a matéria, criando com os seus esforços meios novos e mais amplos de
percepção e manifestação. Apurando-se, por sua vez, os sentidos, verão eles ampliar-se-lhes
o círculo de ação. O cérebro humano tornar-se-á um templo misterioso, de vastas
e profundas naves, cheias de harmonias, vozes e perfumes, instrumento admirável
ao serviço de um Espírito que se tornou mais sutil e poderoso. Ao mesmo tempo
em que a personalidade humana, alma e organismo, a pátria terrestre se transformará.
Para que se opere a evolução do meio é preciso que primeiramente se efetue a evolução
do indivíduo. É o homem que faz a humanidade e esta, por sua ação constante,
transforma a morada daquele. Há equilíbrio absoluto e relação íntima entre o
moral e o físico. O pensamento e a vontade são a ferramenta, por excelência,
com a qual tudo podemos transformar em nós e à nossa volta. Tenhamos somente
pensamentos elevados e puros; aspiremos a tudo o que é grande, nobre e belo.
Pouco a pouco sentiremos regenerar-se o nosso próprio ser e, com ele, do mesmo
modo, todas as camadas sociais, o globo e a humanidade!
E, em nossa ascensão, chegaremos
a compreender e praticar melhor a comunhão universal que une todos os seres.
Inconsciente nos estados inferiores da existência, essa comunhão torna-se cada vez
mais consciente, à medida que o ser se eleva e percorre os graus inumeráveis da
evolução, para chegar, um dia, ao estado de espiritualidade em que cada alma,
irradiando o brilho das potências adquiridas nos impulsos do seu amor, vive da
vida de todos e a todos se sente unida na Obra eterna e infinita.
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